Investigação relaciona arsénio das minas com maior défice cognitivo no Alentejo Interior

Arsénio e outros elementos são libertados para os solos, águas e atmosfera nas zonas mineiras

Os habitantes no Alentejo Interior, junto a antigas zonas mineiras, exibiram concentrações de arsénio (As) superiores e desempenhos cognitivos mais fracos quando comparados com indivíduos do resto do país, segundo um estudo da Universidade de Aveiro.

A questão é que, segundo os investigadores, quanto maior for a presença de arsénio no organismo humano, pior será o desempenho cognitivo. Esta é uma das grandes conclusões do estudo da Universidade de Aveiro (UA) que analisou 76 indivíduos entre os 62 e os 95 anos e residentes em várias zonas do país.

“À medida que envelhecemos, as nossas competências cognitivas vão-se deteriorando. A memória não é tão boa, já não somos tão ágeis de pensamento. Este decaimento é natural e expectável, mas, em alguns casos, pode ir além daquilo que seria esperado para a idade e escolaridade da pessoa. Nestes casos, estamos perante uma condição de défice cognitivo”, aponta Bianca Gerardo, aluna de doutoramento da UA em Neuropsicologia.

A investigadora dedica-se ao estudo dos efeitos de metais pesados e outros elementos potencialmente tóxicos no desempenho cognitivo de adultos e idosos.

A doutoranda desenvolve o projeto – “The environmental exposure to Potentially Toxic Elements as a risk factor for cognitive decline and dementia” – em conjunto com os professores Marina Cabral Pinto, Mário Simões e Sandra Freitas da unidade de investigação GeoBioTec (Geobiociências, Geoengenharias e Geotecnologias) da UA e do CINEICC (Center of Research in Neuropsychology and Cognitive Behavioral Intervention) da Universidade de Coimbra, em colaboração com o Laboratório para Química Verde/Rede de Química e Tecnologia (LAVQ/REQUIMTE) da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto.

Mais arsénio, mais problemas neurológicos

Os resultados mais recentes do projeto apoiam a existência de um efeito negativo do arsénio na cognição. O estudo contou com a participação de 76 pessoas entre os 62 e os 95 anos.

Os participantes foram submetidos a um rastreio cognitivo e à colheita de uma amostra biológica (cabelo), para análise das concentrações de vários elementos.

Após cruzamento dos dados biológicos e dos dados neuropsicológicos, verificou-se que concentrações mais elevadas de arsénio estão associadas a desempenhos cognitivos mais fracos, sendo este metal o segundo preditor mais relevante do desempenho cognitivo, precedido apenas pela escolaridade.

Adicionalmente, e uma vez que os participantes recrutados eram residentes de zonas geográficas distintas, foi realizada uma comparação entre grupos para avaliar a possibilidade de existirem diferenças significativas ao nível do desempenho cognitivo e das concentrações de As no organismo.

“Efetivamente o Grupo do Alentejo Interior, exibiu concentrações de arsénio superiores e desempenhos cognitivos mais fracos que o Grupo Centro Litoral (GCL), mesmo após controlados os efeitos da idade e da escolaridade”, sublinha Bianca Gerardo.

O Grupo do Alentejo Interior foi constituído por residentes permanentes de antigas zonas mineiras associada à Faixa Piritosa Ibérica, onde amontoados de materiais estiveram expostos às condições climatéricas e vão libertando arsénio e outros elementos para os solos, águas e atmosfera.

Estes elementos podem entrar no organismo através de diferentes vias, nomeadamente da inalação de poeiras, ingestão de água e alimentos e absorção dérmica de partículas de solo ou poeira.

Estes resultados alertam para os possíveis efeitos dos fatores ambientais na cognição e para a importância que o seu estudo poderá ter no âmbito do declínio cognitivo e das doenças neurodegenerativas.

O projeto foi financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

 

 



Comentários

pub