O projeto do Centro Oncológico de Referência do Sul (CORS) que foi apresentado pela anterior administração da Unidade Local de Saúde do Algarve «não tem uma área de implantação maior do que o terreno cedido» e o atraso na sua submissão a parecer da Câmara de Loulé deveu-se «a uma mudança na lei», que obrigou a enterrar parte das estruturas previstas, nomeadamente os bunkers destinados à radioterapia.
A garantia foi dada ontem, dia 25 de Fevereiro, na Assembleia da República, por Paulo Neves, que foi vogal do Conselho de Administração da ULS Algarve até 19 de Outubro último, responsável pelas obras e infraestruturas.
Os anteriores administradores da ULS/CHUA – Centro Hospitalar Universitário do Algarve, foram ouvidos numa de várias audições parlamentares na Comissão de Saúde, solicitadas por PSD e PS, sobre a polémica em torno do CORS, cuja conclusão chegou a ser anunciada para o final de 2024.
A 4 de Fevereiro, a Câmara de Loulé veio a público revelar que rejeitou «liminarmente» o projeto que lhe foi apresentado pela ULS, para construção do CORS, porque este excedia as dimensões do terreno que a Associação de Municípios de Loulé/Faro havia cedido para o efeito.
No parecer, além da volumetria, também era referido que o projeto não se coadunava com o uso previsto para o lote cedido, que se encontra numa área classificada pelo Plano de Pormenor do Parque das Cidades como Área Verde Edificada, que limita o tipo de equipamento que ali pode ser construído.
Tudo isto, como se esperava, foram os temas centrais das três primeiras audições da tarde, respetivamente com Tiago Botelho, atual presidente da ULS Algarve, Vítor Aleixo e Rogério Bacalhau, presidentes das Câmaras de Faro e Loulé.
Mas a audição que acabou por trazer novos – e importantes – desenvolvimentos à discussão que decorre há semanas, com tomadas de posição de vários intervenientes, foi a dos antigos administradores do CHUA, mais tarde integrado na ULS Algarve, juntamente com a Administração Regional de Saúde.
Ana Varges Gomes, que lançou o processo em 2021, altura em que presidia à administração do CHUA, começou logo por garantir que o projeto apresentado não ultrapassava os limites do terreno cedido, ao mesmo tempo que assegurava que a memória descritiva da proposta que foi submetida a parecer da Câmara de Loulé deixava claro que um dos pisos seria destinado a investigação.
Esta última garantia esteve ligada a outra que tanto Vítor Aleixo como Rogério Bacalhau deixaram antes: o terreno cedido permitia construir o CORS, porque a Área Verde Equipada do Parque das Cidades prevê a construção de unidades destinadas à investigação.

Mas a “bomba” foi deixada por Paulo Neves, o único elemento da equipa liderada por Ana Varges Gomes [que deixou a administração do CHUA em Outubro de 2023], a transitar para a equipa que se manteve à frente dos destinos desta entidade e, mais tarde, da ULS, até Outubro de 2024.
Segundo este antigo responsável, a demora na apresentação do projeto à Câmara de Loulé deveu-se à necessidade de o alterar, devido a «uma mudança da lei, em Março de 2024».
Esta mudança obrigou a que as áreas destinadas a tratamentos com radioterapia, nomeadamente os denominados bunkers, tivessem de ser construídos num piso subterrâneo. A mesma legislação obrigava à construção de «um bunker de reserva, o que só por si aumentava a volumetria».
Mas, assegurou, o volume de construção acima do solo era abaixo da cota estipulada e ocupava uma área inferior aquela que era permitida.
«Se os bunkers enterrados também contam, a área é de facto maior», disse, embora alegue que, no seu entendimento, o projeto está regular, à luz do Plano Diretor Municipal (PDM) de Loulé.
Esta informação nova deixou visivelmente agastado o deputado algarvio Cristóvão Norte, que é igualmente o presidente do PSD/Algarve, que lamentou não ter tido acesso a estes factos mais cedo, pois mudariam a sua abordagem nas audições anteriores.
Também Ana Abrunhosa, que presidiu à sessão, apontou que os deputados dos três partidos presentes, PSD, PS e Chega, deveriam ter «muito que pensar», até porque as novas exigências da lei poderão ter implicações na assumida vontade do atual Governo de incluir o CORS no projeto do Hospital Central do Algarve – e no terreno reservado para este projeto.
A audição aos antigos elementos dos Conselhos de Administração do CHUA e ULS acabou mesmo com palavras mais duras entre Cristóvão Norte e o deputado socialista Luís Graça, também ele algarvio e eleito pela região, com o primeiro a considerar que devia ter tido acesso à informação dada por Paulo Neves e o segundo a defender que nas audições ficou provado que «havia terreno, havia possibilidade de construção e havia financiamento».
O deputado socialista referia-se às críticas que foram feitas pelo PSD e pelo atual presidente da ULS Algarve de que não havia condições objetivas para o avanço do projeto do CORS, com este último responsável, Tiago Botelho, a admitir que sugeriu à tutela deixar cair o projeto do centro oncológico tal como ele estava e a incluir esta valência na Parceria Público Privada do futuro Hospital Central do Algarve.
Já Ana Varges Gomes, assegurou que ainda seria possível fazer as alterações necessárias, uma vez que o contrato com o projetista contratado estipula que «o pagamento do serviço só ficará concluído quando o licenciamento for concedido» e que «ainda podiam ser feitas todas as alterações necessárias».
A antiga presidente do CHUA alegou que isso só não aconteceu porque «o atual Conselho de Administração não quis», acusação repetida pelos deputados socialistas presentes na audição.
A elaboração do polémico projeto foi adjudicada por um valor de cerca de 320 mil euros, como o Sul Informação já tinha dado conta.
A mesma antiga responsável considerou que, se não se deixar cair o atual projeto, não só se conseguirá «acabar mais cedo» do que se for construído juntamente com o HCA, como se poderá ir buscar não só os 8 milhões de euros já reservados pela CCDR Algarve no Programa Regional Algarve 203o para o centro, como mais fundos europeus destinados à investigação.
Quanto a algumas das questões que estiveram no centro da polémica, nas últimas semanas, tanto Vítor Aleixo como Rogério Bacalhau esclareceram que o terreno não foi cedido pela autarquia louletana, mas sim pela associação de municípios, com o edil de Faro a garantir que, com o projeto que foi apresentado, «se fosse do lado de Faro, o desfecho seria o mesmo».
Vítor Aleixo disse ainda que foi a Câmara de Loulé que teve a iniciativa de convidar os responsáveis da Unidade Local de Saúde para uma reunião, após o parecer negativo dos serviços municipais, onde terá colocado duas possibilidades em cima da mesa: «ou a ULS alterava o projeto para ficar conforme as regras urbanísticas ou avançaríamos com uma alteração ao Plano de Pormenor, algo que já foi feito no passado».
No entanto, assegurou, nunca recebeu uma resposta da ULS.
Obrigado por fazer parte desta missão!