Imagine o leitor que a sua comunidade intermunicipal (CIM), confrontada com os desafios lançados pelas Grandes Transições e os programas PRR e PT 2030, decidia adotar um modelo inovador de inteligência coletiva territorial (ICT) denominado região-cidade, em que os municípios decidiam fazer o rescaling da sua sub-região através de um governo de missão dos bens comuns colaborativos (BCC) e, dessa forma, proporcionar aos seus munícipes uma rede integrada e alargada de multisserviços que são, em si mesmos, uma fonte fundamental de bem-estar para a cidade policêntrica que a comunidade intermunicipal representa.
Está em curso, como sabemos, a descentralização e a transferência de competências para os vários níveis de administração regional, sub-regional e local.
Neste contexto, a CIM, como rede de municípios ou região-cidade, seria a sede privilegiada para acolher e organizar a provisão de bens e serviços comuns fundamentais, a saber:
– A coordenação da oferta de mobilidade suave e transportes públicos intermunicipais,
– A coordenação da oferta de infraestrutura digital, rede e prestação de serviços digitais,
– A coordenação dos serviços de rede das principais utilities intermunicipais,
– A coordenação de medidas do plano verde e gestão de resíduos,
– A coordenação do abastecimento de alimentos do sistema produtivo intermunicipal,
– A coordenação dos cuidados de saúde e apoio domiciliário em regime ambulatório,
– A coordenação da rede de serviços de cultura, desporto, recreio e terapêuticos,
– A coordenação da rede de serviços de segurança e proteção civil contra acidentes graves,
– A coordenação da rede de lojas do cidadão e outros serviços à distância,
– A coordenação da rede de serviços de ensino, emprego e formação profissional,
– A coordenação da rede de acolhimento e a construção de habitação colaborativa
– A coordenação dos investimentos intermunicipais financiados por fundos europeus.
Todos estes serviços podem ser objeto de uma gestão agrupada, ter uma abordagem territorial ajustada à geografia própria da CIM e, do mesmo modo, uma engenharia financeira específica.
A região-cidade, por intermédio de uma estrutura de missão executiva, de um governo de missão, pode desempenhar o papel de agente-principal das economias de rede e aglomeração da sub-região em benefício da respetiva comunidade. Além disso, compete-lhe promover plataformas colaborativas e comunidades inteligentes, que são fundamentais no desenho, geografia e animação da cooperação descentralizada do território.
Com efeito, em plena revolução digital, o governo da CIM, cidade policêntrica, pode ser uma genuína aplicação da teoria do ator-rede.
Ou seja, a revolução digital, face à complexidade dos problemas de hoje, obriga-nos a procurar uma organização que seja capaz de corresponder, de modo efetivo, a essa interação fundamental entre comunidades virtuais geradas por plataformas digitais nascidas na internet e nos smartphones e comunidades reais geradas por relações sociais e associações nascidas no dia a dia dos contactos e intercâmbios entre produtores e consumidores, serviços e utentes.
O ator-rede é o agente desta nova intermediação para a economia digital e o administrador das plataformas colaborativas que aí vêm, em modo de coprodução e cogestão.
É, portanto, uma organização que assumirá múltiplos formatos em função das áreas de atividade, dotada de um mínimo de complexidade e diferenciação, mas, sobretudo, de muita agilidade para enfrentar e resolver os desafios do mundo de hoje.
Plataformas e atores-rede são, portanto, as duas faces da revolução digital. As primeiras como dispositivo de conexão das comunidades online, as segundas como organização material das comunidades offline correspondentes.
A teoria do ator-rede é, assim, uma construção reflexiva gerada no seio da grande transformação digital e observada na experiência de interação entre o dispositivo plataforma e o dispositivo organização.
A CIM, cidade policêntrica, é um ator-rede privilegiado e uma organização que se robustece pela forma descentralizada e cooperativa como se organiza no terreno, se quisermos, um governo de missão no topo de uma comunidade de autogoverno e autorregulação.