Durante 27 anos, a vida de Castro Marim confundiu-se com a de dois homens: José Estevens e Francisco Amaral. Foram presidentes da Câmara, estiveram juntos, mas, já quase no final da vida autárquica de ambos, também foram adversários – e de forma veemente. Divergências à parte, é difícil imaginar como seria o concelho sem o trabalho dos dois: agora que um novo futuro se perspetiva, Castro Marim homenageou-os. E, acima de tudo, agradeceu-lhes.
A atribuição da medalha de honra do Município a José Estevens (a título póstumo) e Francisco Amaral foi um dos pontos altos das comemorações do Dia do Município de Castro Marim, na passada terça-feira, 24 de Junho.
Por ter falecido em Maio de 2023, a distinção foi entregue à família de José Estevens, cabendo ao filho Pedro um discurso emocionado em que relembrou o «amor» do pai ao concelho.
«[O meu pai] tinha uma paixão inestimável por Castro Marim e pelas suas gentes: uma dedicação sem paralelo à causa pública. Esta é uma homenagem de uma terra que reconhece, hoje, os méritos de um dos seus filhos mais pródigos que mudou, para sempre, a história do concelho», disse.
Num discurso muito aplaudido, o filho de José Estevens lançou ainda um desafio.
«Daqui por 100 anos, provavelmente não estará cá nenhum de nós para contar a história de quem foi José Estevens, mas encontrarão, certamente, por este concelho, pelo menos uma pedra de uma obra que ele sonhou e concretizou», considerou.
E elas tinham sido mostradas, minutos antes, num vídeo de resumo do que foram os anos de Estevens enquanto presidente da Câmara (1998 a 2013): a Biblioteca Municipal, a Casa do Sal, o Centro Multiusos do Azinhal, a recuperação do Forte de São Sebastião ou a criação dos “Dias Medievais”.

Foi mais de uma década à frente dos destinos de Castro Marim, mas , em 2013, por ter atingido os três mandatos consecutivos permitidos por lei, Estevens não pôde voltar a candidatar-se.
Na altura, deu lugar – e apoiou – Francisco Amaral, até aí presidente do vizinho concelho de Alcoutim, que ganhou as eleições.
Nesse mesmo ano, Estevens candidatou-se à Câmara de Tavira, mas acabou derrotado pelo socialista Jorge Botelho.
Mais tarde, em 2016, quando a vida política do ex-presidente da Câmara de Castro Marim poderia parecer ter terminado, José Estevens protagonizou um braço de ferro com Francisco Amaral, .
É que, sendo líder da Concelhia do PSD castromarinense, retirou a confiança política a Amaral, porque pretendia também voltar a ser o candidato à Câmara.
Mas a Comissão Política Nacional dos social-democratas manteve o seu apoio à recandidatura do edil Francisco Amaral e Estevens acabou por bater com a porta ao seu partido de décadas, em protesto.
O objetivo de voltar a ser presidente da Câmara de Castro Marim manteve-se, ainda assim, vivo. Por isso, nas Autárquicas de 2017, candidatou-se por um movimento independente (Castro Marim Primeiro – CM1), mas, apesar de ter sido eleito vereador, perdeu as eleições para Francisco Amaral.
O certo é que, na altura, conseguiu roubar a maioria a Amaral, o que dificultou, em muito, o trabalho do presidente da Câmara. De tal forma que, em 2019, o então autarca decidiu “bater com a porta” e marcar eleições intercalares.
Foi uma vitória para Francisco Amaral e uma derrota – porventura a última – para José Estevens. O PSD conquistou a maioria.
Mas, na homenagem desta terça-feira, todas estas tricas políticas estiveram à margem: o essencial foi homenagear o trabalho dos dois antigos presidentes.
Francisco Amaral, que deixou de ser edil de Castro Marim este ano, já aos 69 anos e depois de mais de 30 enquanto autarca, agradeceu às populações de «Castro Marim e Alcoutim o privilégio de ter sido presidente da Câmara».
«Fiz o melhor que podia e que sabia com respeito por todos. Tive equipas fantásticas como esta que está aqui: sem eles, nada disto seria possível», referiu.
«Após 32 anos, diria uma vida, tive momentos bons, outros maus, alguns até caricatos. Dá para escrever um livro de memórias», acrescentou, entre risos.
O momento, muito aplaudido, serviu ainda para um «pedido de desculpa público» à família, «pelo tempo roubado ao convívio».
«Agora acho que mereço uma vida mais calma, embora vá continuar a rabear, como aqui se diz», concluiu o autarca.
E a verdade é que, mais tarde, se percebeu o que queria dizer Francisco Amaral com «rabear» que é como quem diz «andar por aí».
É que o antigo presidente da Câmara vai ser o cabeça de lista do PSD nas Autárquicas deste ano…. à Assembleia Municipal de Vila Real de Santo António, como o próprio já confirmou.

Em Castro Marim, o futuro do concelho também começa a jogar-se. Filomena Sintra, atual presidente da Câmara, será a candidata do PSD – e fez um discurso onde falou do «tanto que há por fazer» e dos «desafios que temos em mãos».
Ricardo Cipriano, vice-presidente da vizinha Câmara de VRSA, vai ser o candidato do PS e também marcou presença na sessão solene. É nele que os socialistas apostam para reconquistar um concelho que lhes foge há quase 30 anos.
E há ainda José Carlos Barros, antigo deputado do PSD, anunciado candidato do PSD à Câmara de VRSA que também assistiu à cerimónia.
A vida política do Baixo Guadiana promete continuar a mexer.
Obrigado por fazer parte desta missão!