Nos últimos anos, a globalização tem levado a uma uniformização na forma como vivemos, especialmente, no chamado Mundo Ocidental.
A própria União Europeia, ao impor uma série de regras que devemos seguir, faz com que o nosso dia a dia comece cada vez mais a ter semelhanças com os dos nossos parceiros europeus, estejam eles na Irlanda, na Suécia ou na Itália.
O Turismo, ao introduzir hábitos de quem nos visita, leva-nos a adotar rotinas que não são nossas.
No entanto, uma das razões pelas quais viajamos é conhecer sítios diferentes, com costumes diferentes, com modos de vida diversos dos nossos. A uniformização a que estamos sujeitos é contra tudo isto e vai fazendo com que sejamos cada vez mais iguais.
Devemos, portanto, estar muito atentos e preservar o melhor possível o que nos torna únicos. Porque, se formos a ver bem as coisas, praias há muitas, em muitos países. Hotéis também.
Temos de ser capazes de criar a diferença, para que as nossas praias e os nossos hotéis sejam uma opção desejada.
E para motivar ainda mais o turista, nacional e estrangeiro, há que ter serviços competentes, acessibilidades adequadas e saber preservar a nossa identidade, pois esta é que faz de nós únicos e especiais.
Infelizmente, temos assistido a um descaracterizar dessa mesma identidade. A adoção de usos e costumes estranhos em detrimento das nossas tradições, que muitos justificam como uma resposta ao que o cliente quer, é começar a perder essa identidade. Desde logo, há três sectores que são os mais afetados e os mais permeáveis nesse processo – a língua, o artesanato e a gastronomia.
Quando falo da língua, já nem me refiro ao modo de falar algarvio, esse então, cada vez mais esquecido – saberão as novas gerações de algarvios o que são griséus? Ou uma besaranha? Ou à babuja?
Refiro-me mesmo à língua portuguesa. Desde ementas a anúncios, o Português é cada vez mais esquecido.
Bem sei que os imigrantes são necessários para manter muitos negócios a funcionar e não é fácil aprender a nossa língua, mas não custa nada e não ofende ninguém que, à chegada a qualquer lugar, sejamos recebidos com um bom dia, que se diga obrigado. São duas ou três palavras que mostram respeito pela cultura do país onde estamos e nenhum estrangeiro, venha de onde vier, rico ou pobre, ficará melindrado por ser recebido na língua mãe. Para começar, não é preciso muito mais.
O artesanato é outra área sensível. Proliferam as lojas de bugigangas, com imanes e outras lembranças, muitas “made in China”, a preços muito convidativos, mas que em nada representam o que os nossos artesãos fazem.
Apesar de muitos anos trabalhar em Turismo, ainda consigo pasmar com a criatividade de certos produtos à venda como recordações de férias no Algarve. Boomerangs? Boomerangs?? Mas o que isto tem a ver connosco?
Precisa-se de projetos que protejam e dimensionem o nosso artesanato, como o “Loulé Criativo” ou outros com amplitude para divulgar o que se faz de tradicional, com qualidade e ligação à região. Só assim podemos ter gente interessada em aprender as técnicas antigas, renovar o produto, manter a originalidade e ao mesmo tempo a identidade.
Mas, seguramente, é a gastronomia que mais sofre com toda esta aculturação. A nossa cozinha, herdeira da Dieta Mediterrânica, que, por acaso, é Património Mundial da Humanidade, que, por acaso, tem uma cidade algarvia a representar Portugal nesta área (Tavira), sofre todos os dias atropelos de diversa ordem.
Em muitos restaurantes, já não há o bom do filete de pescada com arroz de tomate. Agora, vêm batatas fritas a acompanhar. Batatas fritas? Mas são filetes com arroz de tomate ou “fish and chips”?
A ditadura da batata frita está em todo o lado e, em muitos restaurantes, parece que não se conhece outro acompanhamento. Até sardinhas assadas e lulinhas fritas já são servidas assim.
Mas este é apenas um de muitos exemplos. É igualmente irritante ver por todo o lado anunciado “Tapas”. Estamos no país errado. Em Portugal, sempre se petiscou e temos muitos, bons e variados petiscos. Só porque é mais fácil dizer tapas vamos mascarar a nossa tradição?
Ter restaurantes de cozinha internacional, com os pratos dos seus países é uma coisa. Ter restaurantes ditos tradicionais a destruir a nossa própria gastronomia é mais uma incompetência das, infelizmente, várias que por cá grassam.
O Turismo pode e deve ser uma fonte de receita, uma mais-valia para a região. Mas deve, acima de tudo, ser uma atividade na qual os locais se revejam, com a qual se sintam bem, que realmente contribua para o desenvolvimento local.
Mas este não pode, verdadeiramente, existir se continuarmos a deixar de ser nós próprios para ser o que os outros acham que somos.
Obrigado por fazer parte desta missão!