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Paleontólogos investigam fósseis de dinossauros com 230 milhões de anos em Messines e na Penina

De serra de cortar pedra na mão, com óculos de proteção e máscara, um jovem paleontólogo alemão solta, da camada rochosa, um bloco que contém ossos fossilizados de animais com milhões de anos.

O bloco já foi protegido, para não se partir, com uma jaqueta de têxtil e gesso, mas, ainda assim, o trabalho é cuidadoso.

Um grupo de investigadores, liderado por Ricardo Araújo, do CERENA, o Centro de Recursos Naturais e Ambiente do Instituto Superior Técnico (IST), esteve durante dez dias a escavar uma encosta perto de São Bartolomeu de Messines, afetada por falhas geológicas, onde, num afloramento rochoso, foram detetados fósseis provavelmente do Carniano (idade do Período Triásico), ou seja, com cerca de 230 milhões de anos.

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Quando a reportagem do Sul Informação esteve no local, já havia vários blocos de argilito, uma rocha avermelhada e muito frágil, protegidos pela tal jaqueta, à espera de serem carregados para a camião e levados dali para posterior investigação.

E o que está dentro desses blocos? São ossos de dinossauros? Ricardo Araújo é cauteloso, até porque, explica, ainda falta muito trabalho de laboratório para identificar o que são os fósseis recolhidos. Responde apenas que se trata, «de certeza, de animais vertebrados».

«Nestas camadas, pode haver evidências dos primeiros dinossauros e dos primeiros mamíferos», explica, com entusiasmo, o que torna esta descoberta de grande importância para a Paleontologia, a especialidade da biologia e geologia que estuda a vida do passado da Terra e o seu desenvolvimento ao longo do tempo geológico, bem como os processos de integração da informação biológica no registo geológico, isto é, a formação dos fósseis.

Além disso, no mesmo período geológico em que estes fósseis de animais ancestrais aqui foram depositados, aconteceu o «episódio pluvial do Carniano», quando, «durante dois ou três milhões de anos, houve chuvas intensas e um clima muito instável».

Por isso, além de identificar os fósseis que ali ficaram soterrados, a investigação em curso é importante para saber «de que idade exata são estas rochas e o clima da altura».

«Estas rochas testemunharam o surgimento dos primeiros dinossauros e dos primeiros mamíferos. Sabemos que têm ossos de vertebrados, que podem ser até de anfíbios, não se sabe ainda».

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Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Os fósseis em São Bartolomeu de Messines já eram conhecidos desde os anos 70 do século passado, quando foram identificados pelo geólogo francês Christian Palain.

Aliás, toda esta zona do Algarve, integrando os concelhos de Silves, Albufeira e Loulé, faz parte do futuro Geoparque Algarvensis, que está em fase final de candidatura a essa classificação por parte da UNESCO, precisamente devido à riqueza geológica do território.

A cerca de 40 quilómetros de Messines, na zona da Penina, junto à Rocha da Pena, no interior do concelho de Loulé, e mais ou menos no mesmo período geológico, foi encontrado o fóssil do Metoposaurus algarvensis, um grande anfíbio parecido com uma salamandra gigante, com cerca de 227 milhões de anos, que só foi descrito até ao momento nesta região do mundo, ou seja, até agora só aqui foi encontrado.

Os primeiros fósseis do Metoposaurus algarvensis foram descobertos por outra equipa, escavados em 2010 e 2011, e identificados como uma nova espécie em 2015.

A que animais vertebrados pertencem os fósseis identificados e recolhidos neste local perto de São Bartolomeu de Messines só daqui a algum tempo, após o trabalho em laboratório, se saberá.

Ricardo Araújo explica que, nesta bonebed (literalmente, cama de ossos, ou seja, camada rochosa com muitos fósseis de ossos), «já tinham sido descobertas outros espécimes», estudados também por Hugo Campos, paleontólogo do Geoparque Algarvensis, que, aliás, revelou essas investigações numa publicação científica com outros coautores.

No ano passado, Ricardo Araújo e Victor Carvalho fizeram uma prospeção em todo o Algarve, constatando que a zona abrangida pelo candidato a geoparque tem, de facto, um grande valor geológico, porque aí há «mais afloramentos rochosos e fósseis».

«Redescobrimos esta camada, esta bonebed, e decidimos avançar com uma escavação a fundo», «a maior feita até agora», já que «a quantidade de ossos concentrados numa porção de 30 centímetros é muito alta», acrescentou o investigador.

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Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

O trabalho dos paleontólogos foi feito com múltiplos instrumentos incluindo martelos, picos ou serra para pedra. «Primeiro, identificámos a camada que tem os ossos, retirou-se o excesso de rocha e terra e o resto foi feito à mão», porque essa fase é «um trabalho muito sensível» e de «grande dificuldade», devido a estarem a trabalhar numa «rocha que se fratura muito facilmente».

A equipa internacional dirigida por Ricardo Araújo inclui outros portugueses, bem como americanos, alemães, brasileiros, franceses e dinamarqueses, ligados a múltiplas instituições, mas também à Universidade de Bona (Alemanha), ao Museu de História Natural de Londres, à Sociedade de História Natural de Torres Vedras, à NOVA FCT ou à Universidade do Algarve.

Alguns dos elementos deste grupo são «candidatos a estudantes de doutoramento», como Sofia Patrocínio e Victor Carvalho, no fundo, «a nova geração que irá dar continuidade» a este trabalho, explica Ricardo.

Depois de retirados os blocos de rocha, protegidos pela sua jaqueta, estes rumam à Sociedade de História Natural de Torres Vedras, onde os blocos serão preparados por alguns dos elementos do grupo, numa primeira fase para, de forma meticulosa, «extrair o que é apenas rocha e deixar os ossos». Só depois será possível «identificar o que estará aqui».

Além da equipa a trabalhar perto de Messines, uma outra esteve na zona da Penina, codirigidas por Victor Carvalho e Bruno Camilo.

«Éramos para só fazer crivagens, mas descobrimos ossos grandes também» na Penina, acrescentou Ricardo Araújo.

Nessa zona do interior do concelho de Loulé, até como ação integrada no trabalho de divulgação e envolvimento comunitário do candidato a Geoparque, a equipa desenvolveu também atividades educativas, nas Escolas Básicas de Benafim e Tôr e na EB Professor Sebastião Teixeira, em Salir.

«Fomos lá mostrar às crianças o que é um fóssil, o que estamos aqui a fazer», explicou Sofia Patrocínio. No fundo, explicou, foram «tentar desenvolver nos miúdos, um bocadinho mais, o bichinho da Paleontologia».

Ricardo Araújo salienta o envolvimento, neste trabalho, de outros investigadores, como Lígia Castro, da Universidade Nova de Lisboa, Paulo Fernandes, da Universidade do Algarve, mas também a forma como a equipa e o seu trabalho têm sido acolhidos e apoiados pelas Câmaras Municipais de Silves e de Loulé ou pela própria população. Outro apoio fundamental, acrescenta, tem sido o do Explorers Club.

O paleontólogo agradece ainda às proprietárias do terreno perto de São Bartolomeu de Messines a autorização para fazer as escavações, bem como o interesse por elas demonstrado no seu trabalho.

«Toda a gente nos ajuda, de uma forma ou de outra», conclui.

Agora resta esperar pelo trabalho de laboratório para saber que dinossauros (ou mamíferos) é que encontraram ali, naquele talude com vista para Messines, o seu último reduto durante aproximadamente 230 milhões de anos.

Fotos: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

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