Muitas das descobertas arqueológicas são feitas por acaso e esta não é exceção. Mas, neste caso, o que foi descoberto não surpreendeu os arqueólogos.
No dia 17 de Março, parte do troço sul do muro de delimitação do adro da Igreja Matriz de Portimão caiu, devido às chuvas intensas desse mês, bem como também talvez devido às obras que o largo tem estado a sofrer.
Como se trata de um sítio arqueológico sensível, antes da reconstrução do muro, para garantir a «estabilidade» e manter «as características da estrutura anteriormente existente», está a ser feita uma intervenção arqueológica prévia, que a Câmara de Portimão explica, em nota publicada na sua página de Facebook, ser «necessária à salvaguarda dos vestígios existentes nesta área, visto os adros das igrejas serem espaços onde habitualmente se localizam sepulturas».
Até ao momento, já foram descobertas 12 sepulturas, datadas aparentemente da época Moderna ou Contemporânea (séculos XVI a XIX).
Os trabalhos arqueológicos estão a ser feitos pela empresa ERA Arqueologia, a mesma que já tinha sido responsável pelos trabalhos de acompanhamento arqueológico da obra de Reabilitação Urbana do Largo da Igreja Matriz de Portimão, que levaram à descoberta de três silos, provavelmente islâmicos, como o nosso jornal então noticiou.
Rita Dias, arqueóloga e gestora do projeto por parte da ERA Arqueologia, explicou ao Sul Informação que «há várias cronologias que se sobrepõem», já que o mesmo local de enterramento foi sendo usado mais do que uma vez, ao longo dos séculos.
«Temos cronologias anteriores ao terramoto [de 1755] e outras posteriores». Até já foi detetado um nível que será «contemporâneo do terramoto», visto que contém «entulho e azulejos», que deverão ser provenientes da igreja matriz ao lado, que se sabe ter sofrido grandes estragos com o sismo.

Os esqueletos – até agora uma dúzia deles – estão a ser registados e depois retirados, com todos os cuidados científicos, para que sejam posteriormente «estudados, em relação ao sexo, idade, patologias», como explicou ao nosso jornal Vera Teixeira de Freitas, arqueóloga do Museu de Portimão, que acompanha, por parte do Município, esta intervenção.
«Até agora, não surgiu espólio que nos permita datar já, com mais precisão, estes enterramentos. Mas era de esperar que vestígios deste tipo surgissem nesta zona, uma vez que era comum sepultar as pessoas nas igrejas e à sua volta», acrescentou.
Segundo a arqueóloga Rita Dias, da ERA Arqueologia, os enterramentos no adro da Igreja Matriz (ou de Nossa Senhora da Conceição), em Portimão, foram sendo feitos até à década de 1860, cerca de trinta anos depois de o novo poder liberal passar a exigir que, por razões de higiene, os mortos deveriam ser enterrados em cemitérios, na periferia das zonas urbanas.
Segundo o «Mappa demonstrativo do estado de todos os cemitérios existentes no mesmo districto no anno de 1872», da autoria de José de Beires, governador civil de Faro na década de 1870, citado no artigo de Aurélio Nuno Cabrita publicado no Sul Informação, que pode ser lido aqui, o novo cemitério da então Villa Nova de Portimão só foi construído em 1863, a expensas da Câmara Municipal.
Rita Dias adiantou ainda ao nosso jornal que a intervenção arqueológica em curso se deve prolongar ainda «por duas a três semanas».
Segundo a nota da Câmara, «à medida que os trabalhos avançam, é expectável que mais vestígios semelhantes sejam detetados».
A arqueóloga da ERA, por seu lado, explicou que «só vamos escavar ao longo do muro, a não ser que algum dos enterramentos se prolongue para dentro do adro», caso em que «não iremos deixar a escavação de um esqueleto a meio».

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