O sol e o calor que se fazem sentir são a perfeita antítese do que têm sido os últimos dias. As conversas giram todas à volta do mesmo. «Há sete anos que não tínhamos Inverno», ouve-se. Outro grupo de amigos comenta que há ali gente «de todo o Algarve». Não é caso para menos: o que parecia impensável tornou-se mesmo realidade na manhã desta terça-feira, 18 de Março. As chuvas das últimas semanas encheram de tal forma as barragens que duas delas – Odeleite e Beliche (Castro Marim) – tiveram de fazer descargas preventivas. E o povo saiu à rua, animado, esperançado, mas também um pouco preocupado.
Aldina Teixeira é apenas uma das dezenas de pessoas que decidiram ir ver o «acontecimento». Anda de um lado para o outro da estrada, sempre de telemóvel em riste, à procura do melhor ângulo, perto das câmaras de televisão.
As comportas da barragem do Beliche ainda não abriram, mas já se ouve um ruidoso aviso sonoro. Dura quatro minutos e, mal o relógio bate nas 12h04, há um lento abrir das duas comportas. O barulho da campainha dá lugar a um outro som: o da água a jorrar, num cenário que impressiona.
«Isto vai já direitinho para as minhas filhas», diz Aldina, 65 anos, enquanto acaba de gravar um dos muitos vídeos que foi fazendo.

As descargas preventivas que aconteceram ontem não a surpreenderam. «Ainda na segunda-feira, passei aqui perto das 19h00 e vi bem o nível a que já estava a barragem», comenta com a reportagem do Sul Informação.
Aldina mora no Cerro do Enho, paredes meias com o Beliche. Todos os dias passa junto à barragem e até tinha uma técnica muito pessoal para medir o nível da água.
«Agora já não consegue ver, mas havia ali um pequeno montinho que agora está tapado com a água», conta, enquanto vai apontando para a barragem, sempre sorridente.
«Então, eu olhava para lá para ver o que tinha chovido e como estava a barragem», acrescenta.
Os dados mais recentes são impressionantes: tanto Odeleite, como Beliche estão na cota máxima. Teresa Fernandes, porta-voz da empresa Águas do Algarve, explica que o facto de se estar a «libertar água» – que irá para o Rio Guadiana – são «boas notícias».
«Era um cenário que infelizmente parecia impensável e que felizmente deixou de o ser. Estas têm sido umas chuvas abençoadas», comenta com os jornalistas.

O pano de fundo da entrevista é a foz de Odeleite, já à beira do Guadiana, onde também vai correndo muita água, depois da abertura das comportas, logo às 10h00, ainda antes do Beliche.
Desde 2018 que não havia uma descarga preventiva em Odeleite – e, mesmo na altura, foi menor do que a deste ano.
«Chegámos a uma cota tal que, por uma questão de segurança, temos de libertar água porque ela continua a entrar na barragem», diz Teresa Fernandes.
«Passámos recentemente um tempo de seca extrema e há alguns anos que estamos a acautelar o abastecimento de água à região com campanhas de sensibilização… A Águas do Algarve está muito satisfeita por estarmos a abrir comportas», acrescenta.
Quem também não esconde a alegria é o senhor Luís Madeira. Ao ver um jornalista, à entrada da aldeia de Odeleite, hesitante no caminho a tomar, logo se aproxima para ajudar.
«É por ali que tem ir. Tem de descer esta rua, virar na rotunda e chega logo. Está lá muita gente», diz. Residente no Azinhal, também decidiu ir a Odeleite ver as descargas da barragem.

«Eu sou agricultor. Tanta chuva tem sido maravilhoso!», atira. Esta não é a primeira vez que o senhor Luís se lembra de descargas preventivas na barragem de Odeleite, mas os últimos anos quase o fizeram acreditar que nunca mais as veria.
«Enganei-me! E ainda bem! Este ano, choveu mesmo muito e isto é bom para toda a gente. Também para quem tem furos, poços… e para as minhas alfarrobeiras, amendoeiras, oliveiras», atira.
A expetativa é que as descargas durem, pelo menos, até hoje; o cenário de que se voltem a repetir também não é, de todo, descartado. Até porque, segundo as previsões, haverá um novo agravamento do estado do tempo a partir desta quarta-feira, dia 19, com a chegada da depressão “Martinho”.
«Vamos medindo a toda a hora o que está a entrar. Mesmo no Barlavento, onde tinha chovido menos, a situação já se alterou. Os níveis estão a subir e era que bom que, daqui a uns dias, também pudéssemos dizer que a Barragem de Odelouca está cheia», diz a porta-voz da empresa Águas do Algarve.
Regressamos à dona Aldina Teixeira que, enquanto ia olhando para a água a jorrar da barragem do Beliche, também já perspetivava os próximos dias.
«Isto tem sido muito bom, tanta chuva. Até agora não houve, mas também esperemos que não cause estragos», confessa.
«Se Deus quiser», completa o marido que, ao seu lado, também não quis perder a oportunidade de ver, ao vivo, a barragem a descarregar água.
Fotos: Pedro Lemos | Sul Informação
















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