Estudos de viabilidade para a construção de duas novas barragens, no Algarve, nas ribeiras da Foupana e do Alportel, a modernização do Aproveitamento Hidroagrícola do Alvor e a interligação Alqueva-Mira são algumas das obras previstas na Estratégia Nacional “Água que Une”, que foi apresentada este domingo, dia 9 de Março, em Coimbra, pelo primeiro-ministro Luís Montenegro.
Ao todo, a estratégia nacional para a gestão da água, elaborada por um grupo de trabalho criado pelo Governo para o efeito – cujo anúncio foi feito em Faro, a 22 de Maio de 2024 -, conta com quase 300 medidas, algumas das quais a implementar até 2050.
No Algarve, o plano prevê a implementação de 29 medidas, que se espera que possam aumentar as disponibilidades hídricas da região em 272 hectómetros cúbicos (hm3) – entre redução de perdas, reforço da capacidade de infraestruturas existentes e novas origens – e que têm um investimento de quase 500 milhões de euros associado.
Entre elas, contam-se os estudos de viabilidade para a construção das barragens da Foupana e do Alportel, medidas cujo prazo de execução está balizado entre 2027 e 2032 (Foupana) e 2025 e 2032 (Alportel), mas sem qualquer previsão de investimento associada.
Este facto poderá estar ligado ao aviso feito em Dezembro por Maria da Graça Carvalho, ministra do Ambiente, que garantiu que só em «último caso» se avançará com novas barragens no Algarve.
O mesmo não acontece com as obras de conclusão da “Modernização do Aproveitamento Hidroagrícola do Alvor”, que tem um investimento acoplado de 45 milhões de euros (2027-2032) e de “Modernização do Blocos de Silves (2 e 3) no Aproveitamento Hidroagrícola de Silves, Lagoa e Portimão”, que custará 12 milhões de euros (2027-2032).
Na lista revelada pelo Governo, são também focadas outras medidas, como a produção de Água para Reutilização (ApR) em Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) da Águas do Algarve (33 milhões de euros, até 2026), medidas de médio prazo para aumento da resiliência do sistema de abastecimento
público da Águas do Algarve, nas quais se incluem a dessalinizadora e a Tomada de Água do Pomarão (350 milhões de euros, 2024-2035) e um programa a longo prazo para o aumento da disponibilidade de água, também relacionado com o sistema multimunicipal de abastecimento (45 milhões, 2035-2042).
Para o Alentejo, a estratégia preconiza a implementação de 58 medidas, que permitirão ganhos transversais de 477 hm3.
No Baixo Alentejo, destaque para interligação Alqueva-Mira, que permitirá ligar a maior barragem do país à barragem de Santa Clara (35 milhões de euros, 2026-2030). Também prevista está a “Modernização/reabilitação total do Aproveitamento Agrícola do Mira (170 milhões de euros, 2026-2030), que prevê «a redução de perdas e reabilitação integral do sistema adutor de Santa Clara e blocos de rega», segundo se lê num documento disponibilizado pelo Governo.
Foram igualmente anunciados investimentos de 15 milhões na produção de água para reutilização (ApR) nas ETAR do Alentejo e de 140 milhões num programa de reforço da eficiência e da segurança dos sistemas explorados pela Águas Públicas do Alentejo.
De uma forma geral, a estratégia prevê um aumento da eficiência, através da redução de perdas de água nos sistemas de abastecimento público, agrícola, turístico e industrial, a utilização de água residual tratada, a otimização de barragens e a construção de novas.
Prevê ainda a criação de novas infraestruturas de captação de água, unidades de dessalinização e, em último recurso, a interligação entre bacias hidrográficas, estando também integradas medidas para restaurar ecossistemas fluviais e para uma gestão integrada da água.
No que toca à redução de perda de água, foi lançado um programa de ação, que prevê investimentos regionais de 156 milhões de euros para o Alentejo e de 126 milhões de euros no Algarve.
A associação ambientalista Zero já reagiu publicamente à estratégia apresentada pelo Governo, considerando que tem «algumas prioridades certas», mas que é «desequilibrada entre ambiente e agricultura».
A associação alerta «para a necessidade de conhecer em detalhe os fundamentos desta estratégia» e defende «que um tema de tão elevada importância exige um processo de consulta pública alargado, permitindo à sociedade civil pronunciar-se e contribuir para soluções mais equilibradas e sustentáveis».
«Por um lado, há várias prioridades – com destaque para o aumento da eficiência hídrica e promoção do uso racional da água, a redução das perdas de água nos sistemas de abastecimento público, agrícola, turística, industrial, ou a promoção da utilização de água residual tratada -, que são de louvar. Por outro, a estratégia apresentada confirma uma duvidosa aposta no forte aumento da oferta de água para responder àquelas que têm sido as exigências do setor agrícola, favorecendo a expansão de um modelo intensivo e altamente consumidor de recursos hídricos», defendeu.
Quanto à aposta em barragens que está prevista, a Zero diz que o Governo «ignora os riscos da redução da disponibilidade hídrica», que «poderá tornar insustentável a captação de água, especialmente em períodos de seca prolongada. Mais ainda, o impacte ambiental de barragens é enorme e esse é um fator fundamental de decisão».
«A construção da barragem de Alportel, uma das infraestruturas previstas, pode não conseguir garantir os volumes de água esperados numa região onde os níveis de precipitação não têm permitido recuperar os baixos níveis de armazenamento nas barragens já existentes. O risco de um investimento elevado resultar numa estrutura subaproveitada ou ineficaz não pode ser ignorado», alertaram.
Também a AMAL – Comunidade Intermunicipal do Algarve, pela voz do seu presidente, o socialista António Pina, já veio a público considerar que a estratégia «não aporta nada de novo» para o Algarve.
Esta estratégia poderá, ainda assim, nunca sair do papel, pelo menos na sua totalidade, tendo em conta o mais que expectável chumbo da moção de confiança que o executivo liderado por Luís Montenegro apresentou, que levará à queda do novo Governo.
Caberá ao próximo executivo – que até pode ser liderado pelo atual primeiro-ministro – decidir se mantém a aposta na “Água que Une”.
Obrigado por fazer parte desta missão!