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À imagem de outros países, Portugal tem assistido, nos últimos anos, à ascensão de um populismo de extrema-direita, corporizado pelo Partido Chega. Este cresceu eleitoralmente, ampliou a sua capacidade de influência na sociedade, bem como junto de forças partidárias mais moderadas, com interferência direta no desenho de algumas políticas públicas.

Alicerçada no discurso de ódio, no divisionismo, na polarização social, na exploração do medo, na defesa do uso da força por parte dos serviços de segurança, entre outras “bengalas políticas”, a extrema-direita tem sido capaz de construir um legado em Portugal, perante o desnorte e a incapacidade das principais instituições democráticas de o contrariar. Esse é hoje bastante visível em diversos domínios, entre os quais destaco os que exponho de seguida.

A normalização do discurso de ódio e da exclusão

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Ao trazer quotidianamente para o centro do debate político narrativas focadas no preconceito, na xenofobia e na divisão social, o populismo de extrema-direita tem sido capaz de criar um ambiente em que o ódio e a intolerância deixam de ser amplamente condenados e passam a ser vistos como opiniões válidas, inclusive dentro das instituições democráticas.

Esta normalização tem contribuído para legitimar e enraizar atitudes discriminatórias na sociedade, bem como na ação política de partidos mais moderados, dificultando a afirmação de valores como a igualdade e a solidariedade.

A simplificação do debate público

Ao oferecer soluções simplistas e irrealistas para problemas complexos, o populismo de extrema-direita tem vindo a reduzir o espaço para um debate político informado e construtivo em Portugal.

A sua estratégia tem passado sobretudo pelo uso recorrente de narrativas elementares que apelam diretamente às emoções, como o medo e a ressentimento, em vez de argumentos racionais ou soluções baseadas em evidências, empobrecendo a ação política em domínios como a imigração e a segurança, bem como contribuindo para propostas superficiais, que não resolvem os problemas a que se referem.

A fragmentação social

A estratégia de “nós contra eles”, sendo «eles» os nossos inimigos, central na retórica do populismo de extrema-direita, tem contribuído para fragmentar a sociedade portuguesa, criando divisões entre grupos de uma mesma comunidade.

De acordo com esta abordagem, a política tem vindo a deixar de ser um espaço para a construção de um futuro coletivo, para se transformar num campo de batalha, com confrontos permanentes, que enfraquecem a coesão social e dificultam a construção de consensos necessários para enfrentar desafios coletivos.

O ataque ao humanismo

Uma das apostas mais evidentes do populismo de extrema-direita em Portugal passa por defender políticas que restringem os direitos de minorias, migrantes e outros grupos vulneráveis.

Esta narrativa reflete uma preocupante perda de humanismo na ação política, capaz de criar lastro na sociedade portuguesa e em outras forças partidárias, comprometendo décadas de avanços no campo dos direitos humanos e procriando um ambiente de maior exclusão e desigualdade.

A desvalorização do compromisso político

Uma das consequências da ascensão de extrema-direita em Portugal é o estreitamento do diálogo e a diminuição do compromisso político.

Ao invés de buscar soluções que envolvam negociação e acordos entre diferentes forças partidárias, os populistas muitas vezes adotam uma abordagem de confronto direto, onde “vencer” se torna mais importante do que chegar a um acordo.

Esta tendência tem vindo a criar impasses e imprevisibilidade, dificultando a implementação de políticas públicas.

A normalização da desinformação

A extrema-direita tem-se revelado particularmente hábil na manipulação da opinião pública, através do recurso a discursos emocionais, normalmente alimentados por desinformação e notícias falsas.

A utilização intensiva das redes sociais tem sido uma estratégia muito eficaz para disseminar mensagens divisionistas e polarizadoras, que apelam diretamente ao medo, à raiva e ao nacionalismo, criando bolhas informativas que tendem a ser amplificadas sem a necessidade de filtro jornalístico.

Isso tem contribuído para a normalização da desinformação, criando um ambiente em que a verdade factual é substituída pela criação de perceções públicas distorcidas da realidade, dificultando o debate político racional em Portugal.

A descredibilização das instituições democráticas

A extrema-direita populista tem como estratégia recorrente o ataque às instituições democráticas, como a Presidência da República, o Parlamento e os partidos tradicionais, acusando-os de corrupção ou de servirem os interesses das elites.

A narrativa passa por descredibilizar o mais possível estes atores, esperando por essa via reforçar-se enquanto alternativa. Esta investida sistemática, associada à normalização da desinformação, mina a confiança pública nas instituições, enfraquecendo os pilares que sustentam a democracia e abrindo espaço para soluções mais autoritárias.

Face ao exposto, é evidente que o populismo de extrema-direita tem, de facto, mudado a forma como se faz política em Portugal.

Isso é visível nas disputas quotidianas, no debate parlamentar, na forma como ocupa o espaço público e mediático, nas estratégias eleitorais, assim como nas medidas que propõe.

Este fenómeno não só altera as narrativas, mas também deteriora a coesão social e as dinâmicas de poder, bem como a relação entre os cidadãos e as instituições. A longo prazo tenderá a afetar a natureza das instituições e da própria democracia.

As mudanças verificadas são negativas em toda a escala, mas é importante lembrar que o legado dessas forças políticas não é inevitável.

Tal requer um esforço coordenado e multifacetado, capaz de envolver instituições democráticas, serviços públicos, meios de comunicação, sociedade civil organizada, grupos e movimentos sociais, entre outros.

Contrariar as tendências emergentes exige uma abordagem integrada. Não basta combater os sintomas do populismo; é necessário enfrentar as causas que alimentam o seu crescimento.

Reforçar as instituições democráticas e dotá-las de meios de ação, apostar na educação cívica, fortalecer a participação pública, combater a desinformação, promover formas ativas de diálogo e inclusão social, robustecer as redes comunitárias e de proximidade, e defender os valores humanistas são passos essenciais para mitigar os danos e construir uma sociedade mais justa e inclusiva.

A democracia é resiliente, mas não é invulnerável e não se defende sozinha! É uma força construída coletivamente, pelo que exige vigilância constante e uma ação determinada para preservar os seus alicerces.

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