“Os idosos são uma classe de pessoas um bocado esquecidas e isso é uma coisa que nos toca”. As palavras são de Ana Dias, com os seus mais de 20 anos dedicados à assistência direta.
Trabalhar com idosos não é apenas um ofício para Ana Dias, é um compromisso de vida. Aos 63 anos, esta auxiliar de ação direta da vila de Alvalade do Sado (concelho de Santiago do Cacém), conta com mais de vinte anos de serviço dedicado à geriatria.
Para Ana, a profissão vai além das tarefas rotineiras: “Os idosos são uma classe de pessoas um bocado esquecidas e isso é uma coisa que nos toca”, afirmou com emoção ao falar sobre a importância de demonstrar carinho e afeto aos seus utentes.
A trajetória de Ana no auxílio aos mais idosos não foi algo planeado desde o início. Antes de ingressar na área da saúde, ela trabalhava no campo, como grande parte da população local. No entanto, o declínio das oportunidades no setor agrícola e o desemprego crescente na vila levaram-na em busca de novas alternativas.
“Tirei o curso de geriatria entre 1994 e 1995, porque havia poucos trabalhos na época, e acabei por entrar nesta área”, explica Ana.
O curso de geriatria foi criado pela Casa do Povo de Alvalade, com o intuito de gerar emprego para os moradores locais. “Naquela altura, tirei o curso, mas nem toda a gente ficou empregada logo. Eu mesma passei por contratos temporários até ser integrada no quadro, em 2000”, relembra.

Atualmente, Ana trabalha para a Casa do Povo, uma instituição com três valências: um centro de dia, que inclui um serviço dedicado ao apoio domiciliário dos idosos, uma Estrutura Residencial para Pessoas Idosas (ERPI) e uma área dedicada às crianças, nomeadamente creche e pré-escolar.
Ana atua no apoio domiciliário, em busca do bem-estar geral dos seus utentes, dando todo o apoio necessário.
“A gente cuida da higiene pessoal e habitacional deles. Alguns só precisam que limpemos a casa; outros precisam de banhos. Mas, quando se trata de cuidados de saúde mais específicos, nós encaminhamos para os técnicos e enfermeiros”, explica.
Apesar dos desafios diários que enfrenta, como é o caso da falta de recursos em algumas habitações que visita, Ana destaca a importância de adaptar-se à realidade de cada utente: “Trabalhamos com aquilo que há. Se acaba o detergente, temos de avisar e gerir com o que está disponível.”
Para Ana, o seu papel transcende as tarefas práticas. O contacto diário com os idosos é muitas vezes a única interação social que eles têm. “Eles ficam o dia todo sozinhos, e aquele bocadinho em que a gente está com eles faz toda a diferença. Esperam por nós como se fôssemos da família. Conversamos sobre coisas leves, tentamos alegrá-los”, conta.
Essa conexão emocional, segundo Ana, é fundamental para o bem-estar holístico dos idosos e também para manter a sua motivação enquanto profissional. “É gratificante ver como um gesto simples ou uma conversa pode melhorar o dia deles. São pessoas sensíveis, e é uma classe que precisa muito de cuidado e atenção.”
Apesar de ter começado a trabalhar com idosos há mais de duas décadas, Ana não parou de aprender, procura estar sempre informada, adquirindo novos conhecimentos que serão úteis para a sua profissão. A auxiliar participa regularmente em formações oferecidas pela entidade empregadora. “De vez em quando, trazem enfermeiras ou outros profissionais para nos ensinar novas técnicas ou reforçar o que já sabemos. É importante para não esquecermos os procedimentos corretos”, ressalta.

Embora tenha uma vasta experiência, Ana reconhece que cada idoso é único e requer adaptações específicas. “Com o tempo, aprendemos a lidar com as diferentes manias e necessidades de cada um. É um aprendizado constante”, afirma. Segundo a mesma, Ana Dias nunca trabalhou diretamente com utentes que tenham Alzheimer ou Parkinson, o que seria um desafio ainda maior.
Ao longo dos anos, Ana colecionou muitas histórias com os seus utentes. Uma das que mais recorda envolve a senhora Mariana Paula, conhecida pela sua impaciência.
“Ela andava às voltinhas porque queria que eu passasse a ferro, mas a luz estava desligada porque um senhor estava a arranjá-la. Esse senhor foi ao pé dela e acabou por fazer um verso para acalmá-la: ‘Não sejas tão apressada, que o tempo não volta para trás; tens de dar tempo ao tempo, com o tempo tudo se faz.’ Rimo-nos muito”, conta.
Embora ame o que faz, Ana não esconde que trabalha também por necessidade. “Faço porque preciso do salário. Mas, independentemente disso, é algo que gosto de fazer. Ver a alegria dos idosos e saber que estou a fazer diferença na vida deles é muito recompensador”, reflete.
Quando questionada sobre o futuro, Ana espera continuar a desempenhar seu papel com dedicação e humanidade. Para ela, o verdadeiro sentido do trabalho está na empatia e no impacto positivo que pode trazer para aqueles que mais precisam. “No fundo, os utentes tornam-se quase como uma pessoa da nossa família”, conclui.
Texto e fotos de João Silva, produzidos no âmbito do curso de Fotografia Profissional 23|25 da ETIC_Algarve, Escola de Tecnologias, Inovação e Criação do Algarve.