Como pai, compreendo profundamente os desafios do dia a dia na criação dos nossos filhos. No meio do ritmo acelerado da vida, os dispositivos eletrónicos parecem, por vezes, uma solução rápida e eficiente para acalmar as crianças durante momentos de birra ou aborrecimento.
Quem nunca recorreu a um tablet ou smartphone para dar alguns minutos de descanso ou acalmar uma situação mais tensa?
No entanto, à medida que mergulhamos mais profundamente nesta era digital, torna-se essencial refletir sobre o impacto que este uso frequente pode ter no desenvolvimento emocional dos nossos filhos.
Hoje trago uma perspetiva tanto pessoal como científica sobre o uso excessivo de tecnologia como “pacificador digital” e proponho estratégias para equilibrar as emoções das crianças sem depender exclusivamente dos dispositivos eletrónicos.
A tecnologia e a regulação emocional: um equilíbrio delicado
Tal como muitos outros pais, também me vi em situações onde o tablet se tornou uma solução prática e rápida para acalmar uma birra inesperada ou o aborrecimento em momentos menos oportunos.
No entanto, como pai e cientista, entendo que a capacidade de uma criança lidar com as suas emoções é desenvolvida, sobretudo, através da interação com o ambiente, com os pais e com outras crianças. Quando substituímos essas oportunidades por estímulos digitais, estamos a retirar-lhes a chance de aprender a regular emoções como frustração, raiva ou tristeza.
Na última década vários estudos mostram que, embora a tecnologia possa ser um recurso útil, o seu uso contínuo para acalmar crianças pode prejudicar o desenvolvimento de competências emocionais.
As crianças precisam de tempo e espaço para experienciar as suas emoções, sem distrações digitais que as impeçam de aprender a lidar com esses sentimentos de forma natural.
Os nossos filhos aprendem a gerir o mundo através das suas interações. A utilização excessiva de dispositivos eletrónicos para lidar com as suas emoções pode ter consequências a longo prazo, como dificuldades em lidar com o stress ou desafios emocionais sem recorrer à tecnologia.
Além disso, há um crescente corpo de evidências que liga a utilização prolongada de ecrãs a problemas de atenção, distúrbios de sono e até dificuldades no desenvolvimento da fala.
Aqui em casa, temos procurado encontrar um equilíbrio. Sabemos que não é realista eliminar completamente a tecnologia, mas é essencial estabelecer limites claros e proporcionar oportunidades para que as crianças explorem formas mais naturais de expressar e compreender as suas emoções.
Alternativas saudáveis ao uso de tablets
Como pai, sei que o caminho mais fácil muitas vezes parece ser o recurso à tecnologia. Mas, com o tempo, percebi que existem alternativas mais saudáveis e gratificantes para ajudar os nossos filhos a lidar com os seus sentimentos. Algumas das estratégias que literatura suporta são:
1. Promover a conversa sobre emoções: Incentivar os nossos filhos a falar sobre o que estão a sentir pode ser uma ferramenta poderosa. Em vez de evitar as emoções, ensiná-los a reconhecer e nomear o que estão a sentir ajuda-os a entender que todas as emoções – desde a alegria até à frustração – são naturais e normais.
2. Brincadeiras ao ar livre: Tenho visto o impacto positivo que atividades físicas ao ar livre têm nas minhas crianças. Brincadeiras no parque, andar de bicicleta ou simplesmente correr, ajudam a dissipar energias acumuladas e oferecem-lhes uma forma saudável de libertar emoções. Ir ao parque municipal ou explorar uma mata tem sido algo referenciado como uma prioridade
3. Criatividade nas brincadeiras: Sempre que o aborrecimento surge, a criatividade pode ser um grande aliado. Oferecer materiais simples, como papel, lápis e brinquedos não estruturados, pode estimular a imaginação das crianças e oferecer-lhes uma alternativa ao tablet. Existe um ‘caos’ saudável no espaço dedicado às minhas crianças, e isso é algo (por agora) devemos manter.
4. Limites claros para o uso de ecrãs: Estabelecer regras para o tempo de ecrã é uma das maneiras mais eficazes de reduzir a dependência digital. Aqui em casa, limitamos o tempo de uso de dispositivos a momentos específicos do dia, garantindo que o restante tempo é dedicado a atividades que envolvem mais interação humana e criatividade. A colocação de pratos e talheres é uma tarefa dos mais pequenos, mas lançamos um desafio muitas vezes: “Nada pode estar de forma igual ao que já vimos nos últimos dois dias” (sim, já tive de comer jardineira com pauzinhos chineses).
Como pai e educador sinto o peso das decisões que tomamos todos os dias na criação dos nossos filhos. É um equilíbrio delicado entre utilizar a tecnologia como uma ferramenta útil e evitar que se torne num refúgio emocional.
Ao promovermos um ambiente onde as emoções são aceites e compreendidas, estamos a dar-lhes as melhores ferramentas para se tornarem adultos resilientes e emocionalmente equilibrados.
Afinal, ensinar os nossos filhos a navegar pelas suas emoções sem recorrer sempre ao “pacificador digital” pode ser uma das maiores dádivas que podemos oferecer.
Ao equilibrar o uso da tecnologia com atividades e momentos de interação emocional, estamos a criar uma base sólida para um desenvolvimento saudável — tanto digital como emocional.
No final, o verdadeiro presente que oferecemos aos nossos filhos não está na tecnologia, mas nas lições emocionais que lhes transmitimos, com amor e paciência, (quase) todos os dias.
Autor: Tiago Cunha Reis, PhD, é docente universitário, doutorado em Bioengenharia e aluno de Medicina