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Ao longo da história sempre existiram migrações. Os povos desde há muito que migram. Nós, portugueses, já saímos do país à procura de melhores condições, à procura de aventura ou à descoberta de novos mundos.

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Hoje, uma parte das pessoas que migram fazem-no pelas mais diversas razões, a guerra, a falta de alimento para os filhos ou até mesmo empurrados pelas consequências das alterações climáticas.

Serão as aves como nós? Num frenesim constante de lá para cá, num movimento perpétuo que nada tem de monótono, nessa harmonia de ir e vir?….

No início dos tempos, pensava-se que as aves desapareciam no fundo do mar ou em buracos para “hibernar” durante o inverno, regressando na primavera. Na verdade, até hoje. apenas se conhece uma única espécie de ave capaz de hibernar – o Noitibó-de-Nutall (Phalaenoptilus nuttallii), uma espécie que habita o deserto da Califórnia.

Mas a observação das aves que rasgam o céu sempre nos fascinou e foram as observações de Cegonhas-brancas (Cicconia cicconia) atravessadas com lanças ou carregadas de artefactos cuja proveniência era atribuída à África Ocidental que nos fez compreender o movimento de ir e vir chamado migração. Essa capacidade de atravessarem regularmente várias zonas do mundo aumentou o interesse por melhor compreender e estudar as aves.

 

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Os primeiros estudos de migração consistiam apenas na observação e contagem das chegadas e das partidas. Os ornitólogos, com os seus cadernos de campo, registavam a azáfama da vida das aves.

No final do séc. XIX, iniciou-se a partilha das coordenadas das observações nos diferentes países, de forma a se poder mapear a rota das aves; a partilha de informação fazia-se entre os membros das sociedades de ornitologia, em encontros como seminários e congressos, em ambiente restrito e fechado.

Foi preciso esperar até ao final do séc. XIX, para que, pela mão do ornitólogo dinamarquês Hans Christian Mortensen, a anilhagem de aves começasse a ser usada
para estudar o comportamento das migrações das aves.

Desde então, os métodos para estudar as aves evoluíram, e atualmente recorre-se a transmissores de rádio (radio tracking), a transmissores eletrónicos (data-loggers) e à ciência cidadã. Com os recursos da internet, pessoas de todo o mundo registam as suas observações de aves em plataformas específicas e disponíveis a qualquer um! Um exemplo da globalização da informação ao serviço da ciência!

Outras espécies de animais também migram (mamíferos, insetos, tartarugas marinhas, peixes), mas nenhum outro tipo de migração é tão complexo, desenvolvido e fascinante como a migração das aves. Porquê? Provavelmente pela diversidade de rotas de migração, ou pelas enormes distâncias percorridas por algumas espécies, ou mesmo pela capacidade de algumas aves atravessarem ambientes tão hostis como os desertos, os oceanos ou mesmo enormes cordilheiras.

As aves estão adaptadas para percorrer longas distâncias, através do voo, que é um tipo de deslocação mais rápido do que andar ou nadar e os seus eficazes sistemas respiratório, cardiovascular e metabólico estão adaptados para facilitar esses grandes voos.

 

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Geralmente as aves migram de norte para sul no outono, e de sul para norte na primavera, isto no Hemisfério Norte; mas algumas espécies migram de este para oeste, como é o caso do Zarro-comum (Aythya ferina). Será que a migração no Hemisfério Sul, se processa de modo contrário?

Algumas espécies que nidificam no Hemisfério Norte invernam no Hemisfério Sul, isto acontece com o Andorinhão-preto (Apus apus).

E as aves que nidificam neste Hemisfério, invernam no Hemisfério Norte? À exceção das espécies marinhas, poucas espécies que nidificam no Hemisfério Sul migram para o Hemisfério Norte. A massa continental no Hemisfério Sul é menor e as temperaturas em geral mais amenas, estes fatores provavelmente condicionam a migração das aves. Contudo, a migração no Hemisfério Sul é ainda pouco estudada e encerra alguns mistérios.

Os movimentos de migração podem ocorrer em qualquer mês do ano, de acordo com a localização. Do ponto de vista ecológico, por vezes, é difícil explicar como evoluiu o fenómeno da migração, já que a distribuição de algumas espécies está sempre a mudar, quer durante as diferentes estações do ano, quer localmente. Por exemplo, a mesma espécie pode ocupar diferentes habitats ao longo do ano.

Algumas espécies migram durante a noite, enquanto outras o fazem durante o dia; parece não existir nenhuma tendência específica. As espécies que normalmente desenvolvem a sua atividade durante o dia, podem migrar durante a noite.

Este paradoxo aparentemente podia trazer desvantagens, já que a sua visão não está tão adaptada para ver à noite. Pensa-se que em termos de dispêndio energético poderá ser mais vantajoso viajar à noite, já que se pode evitar mais facilmente condições meteorológicas adversas e os predadores.

 

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As aves que voam durante o dia, fazem-no preferencialmente nas primeiras horas da manhã ou nas últimas horas do dia, quando o ambiente está mais tranquilo. As rapinas e as aves planadoras migram principalmente de dia, a qualquer hora, e sobre áreas continentais, evitando grandes massas de água. Cada ave tem a sua forma própria de migrar, sendo por vezes difícil de explicar.

Muitas espécies migram em bandos, adotando uma organização de voo em forma de V, pois permite-lhes uma poupança energética, num processo semelhante ao observado em provas de ciclismo, quando os atletas se agrupam uns atrás dos outros, por vezes revezando-se na frente, para reduzir o efeito de atrito do ar.

Outras espécies, como é o caso das aves planadoras, juntam-se em bandos, utilizando os mesmos corredores migratórios e as correntes térmicas ascendentes , e, nestes casos, parece existir uma certa atração social, o que faz com que os indivíduos imitem o comportamento uns dos outros.

Esta extraordinária viagem pode ser realizada de uma só vez, especialmente quando são migrações relativamente curtas ou quando migram sobre a água ou outros habitats desfavoráveis, demorando apenas alguns dias. Ou então, a viagem pode ser feita mais lentamente, efetuando paragens ao longo das suas rotas, em lugares muito importantes de descanso e de alimentação.

Há muito que se realizam estudos para responder a algumas questões pertinentes: Como sabem as aves quando têm que migrar? Como sabem para onde vão?

Uma das explicações poderá estar relacionada com a duração do dia, que funciona como gatilho para quando devem partir. A disponibilidade de alimento também parece ser outro dos motivos para a viagem.

 

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Mas estudos genéticos também revelaram que essa informação poderá estar já contida nos genes: quando, quais, a duração e direção a seguir é algo que passa de geração em geração. Outras possivelmente orientam-se por marcas orográficas, como rios, montanhas, lagos, outras pelas estrelas ou pela posição do sol!

Provavelmente, as aves, como muitos outros seres vivos, também possuem uma “bússola” interna, utilizando o campo geomagnético da terra.

Na migração das aves, as regras variam de espécie para espécie e até mesmo dentro da mesma espécie, quer nas rotas utilizadas, datas e estratégias adotadadas.

Apesar das aves constituírem um dos grupos mais bem estudados e monitorizados do mundo, novas descobertas são feitas todos os anos. Talvez por isso, continuem a ser um dos grupos mais fascinantes, emblemáticos e misteriosos!

Partilhamos estes habitats com estas maravilhosas criaturas, que, com o seu canto e cores, alegram os nossos dias! Encontramo-las um pouco por todo o lado e também dependem de nós para a sua sobrevivência.

Seremos nós parecidos às aves? Também nós buscamos um local mais agradável, onde possamos descansar, passear, relaxar do nosso dia-a-dia atribulado…

O Algarve é assim, quer para a maioria das aves, quer para os turistas. No Inverno, muitas espécies encontram o clima e alimento necessário. Na primavera e verão, as temperaturas quentes e abundância de alimento, as praias e bonitas paisagens, fazem o deleite de qualquer pessoa ou ave!

 

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Referências

https://books.google.pt/books?hl=ptPT&lr=&id=_oE29KijRlAC&oi=fnd&pg=PP7&dq=bird+migration&ots=4cpOOtNs9Q&sig=Te7tEN86po76ufBFoSTiVDR10CY&redir_esc=y#v=onepage&q=bird%20migration&f=false

https://www.spea.pt/wp-content/uploads/2020/03/laymans_pt_2010.pdf

Newton, Ian – The Migration Ecology of Birds, Cambridgeshire, Reino Unido, 2008, Elsevier, 978-0-12-517367-4

Ossenkopp, Klaus-Peter; Barbeitto, Raphael, 1978, Bird Orientation and the Geomagnetic Field: A Review, Neuroscience and Biobehavioral Review, vol II, pag 255-270

Halupka, Lucyna; Dyrcz, Andrzej; Borowiec, Marta; 2007, Climate Change affects breeding of Reed Warblers Acrocephalus scirpaceus, Journal of Avian Biology, vol 39, pag. 95-100

Jahn, Alex E., Levey, Douglas J., and Smith, Kimberly G., 2004, Reflections across Hemispheres: a systemwide approach to new world bird migration, The Auk, vol.121, pag.1005-1013

Hugh Dingle (2008) Bird migration in the southern hemisphere: a review comparing continents, Emu – Austral Ornithology, 108:4, 341-359, DOI: 10.1071/MU08010

 

Autora: Filipa Bragança é bióloga no Centro Ciência Viva de Lagos

 

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Nota: Este artigo foi desenvolvido no âmbito do projeto PaNReD – Património Digital transformado em Recursos Didáticos Digitais, financiado pelo Programa CRESC Algarve 2020, através do Portugal 2020 e do Fundo Social Europeu (FSE).

 

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