T4: E4 – Branca>>São João da Madeira
Uma das coisas mais interessantes do Caminho é o convívio entre nós. Assim aconteceu ontem no jantar que reuniu oito peregrinos, mais o dono do albergue, também ele um peregrino.
Três americanos, professores, uma inglesa reformada, uma estudante eslovaca e um casal que só hoje descobri que era portuguêses, porque não disseram nada, provavelmente porque toda a conversa decorreu em inglês. Curiosamente, um dos americanos, do Colorado, um estado bem no centro dos Estados Unidos, falava francês.
O dono do albergue tem um acordo com um restaurante próximo e a ementa foi carne de porco com batata assada no forno, e estava muito bom. Um dos estrangeiros foi amavelmente objeto de risota quando disse que o frango era delicioso e outro, tirando uns brócolos enormes da travessa, suspirava, dizendo não poder acreditar que iria gostar tanto de legumes.
Como se calcula, a comida – e o vinho – são ótimos desbloqueadores de conversa e falámos sobre tudo, desde o sistema de ensino, passando pelo Brexit (ainda não foi desta que encontrei um inglês que o apoiasse) e os motivos que levaram cada um a ser um peregrino. Acho que a resposta mais consensual era “porque sim… “
Os americanos acharam Lisboa uma capital muito limpa, mas estranhavam a quantidade de prédios degradados. Outra das nossas especificidades foi o café português, que eles dizem que é único e não consegue ser replicado fora de cá. E o vinho… Tinham passado à porta das Caves de S. João, tinham entrado e, simpaticamente, ofereceram-lhes umas provas. Evidentemente, compraram umas garrafas, mas, com um ar divertidamente pesaroso, diziam que já não tinham nenhumas… Mas todos adoraram o vinho do Porto com que o jantar foi finalizado, enquanto bebiam aquilo em quantidade, como se fosse vinho normal.
Das histórias de peregrinos, fiquei com uma duns estrangeiros que iam para Santiago, mas, no tempo da Covid, encontraram a fronteira fechada. Como lhes disseram que o único aeroporto que estava aberto era o de Faro, resolveram voltar para trás e ir até ao Algarve, a pé. Provavelmente, quando lá chegaram já estava tudo normalizado.
Este albergue em Branca tem uma particularidade: não tem preço, aceita o donativo que o peregrino quiser deixar. Mas tenho quase a certeza que o dono não fica prejudicado.
Voltando ao episódio de hoje, esperava pior desta etapa. Embora a paisagem natural não fosse grande coisa, a paisagem humanizada foi interessante, especialmente o centro histórico da Bemposta e os muitos vestígios medievais que se vão encontrando.
E as pessoas continuam sempre dispostas a ajudar. Tive uma pequena hesitação sobre a direção a tomar e logo um automobilista desatou a gesticular, apontando o caminho certo.
No campeonato dos jardins, a taça de hoje vai para o guardião da horta, preparado para o que der ou vier…
Entretanto, todo o caminho foi feito debaixo de uma grande humidade, que se adensou em Santiago de Riba-Ul (fantástico nome de terra) e, a partir de Cucujães, nos últimos três quilómetros, se transformou em chuva.
Devidamente equipado com mochila, bordão, capa de chuva, escorrendo pingando, ao fim de 20 quilómetros, fiz uma entrada direta noutro mundo, noutra dimensão: na 8ª Avenida, um centro comercial enorme à entrada de São João da Madeira!!!