«Quer um bocadinho de sopa?» «É de quê?» «De beterraba» «O que é isso?» «É um legume, nasce como se fosse uma raiz, uma espécie de nabo e é muito bom para o sistema cardiovascular e para o coração».
Esta podia ser uma conversa mantida numa aula de nutrição ou num restaurante ou até mesmo uma conversa banal, dentro de casa, mas não é: este diálogo teve lugar, à hora de almoço, entre um cliente e Alexandra Matos e Pedro Cruz, do Mr. Portuguese Bakery, uma padaria com opções para todos, que funciona há um ano em Tavira.
Depois de mais um dia de trabalho, passado entre o normal expediente e as conversas entre proprietários e os vizinhos que frequentam o estabelecimento, Alexandra Matos e Pedro Cruz puderam, enfim, sentar-se à mesa com o Sul Informação, para contar a história desta padaria plantada no centro da cidade de Tavira.
Muitos podem perguntar: porquê a abertura de mais uma padaria? O que tem esta de diferente?
É que este é um negócio que não é igual aos outros, é uma padaria e pastelaria que aposta em produtos saudáveis e em fazer pão «como antigamente», ou seja, «tudo à mão», sem farinhas processadas e com fermentação natural.
Por outro lado, procura ter opções para todos, nomeadamente para pessoas com estilo de vida vegan.
Mas nem sempre foi assim.
Quando abriu, esta era uma padaria semelhante a muitas outras, com bolos normais, inspirados na cozinha francesa, mas com sabores portugueses.
No entanto, como muitas pessoas vinham à procura de opções sem ovos, sem lactose e sem glúten, a partir de Janeiro os donos do espaço decidiram tornar a pastelaria totalmente vegan.
«Sempre pensei que um dia, quando tivesse o meu próprio negócio, queria que fosse um desafio e estar sempre a inovar todos os dias», diz Pedro, responsável pelo Mr. Portuguese.
«Aqui marcamos uma diferença bastante grande relativamente às outras pastelarias, porque, quando abrimos, ficámos espantados ao saber que existiam farinhas já preparadas para fazer bolos. Tira todo o brilho do que é a pastelaria, do que é cozinhar, do que é confecionar», considera Alexandra Matos, proprietária do Mr.Portuguese.
«Além de fazer tudo de raiz, eu uso tudo fresco, desde fruta, legumes, os sumos, ou seja, nós não nos privamos de matéria prima de qualidade», acrescenta Pedro Cruz.

Os proprietários, que fazem das questões ambientais uma bandeira, tentam trabalhar com produtos locais e nacionais.
Para isso, a padaria tavirense mantém parcerias com algumas empresas, como por exemplo a “Lima com Pimenta” (empresa portuguesa localizada em Moncarapacho), fornecedores de legumes e vegetais. Outro parceiro, para produzir o pão, são as Farinhas Paulino Horta, fornecedor português de farinhas e que a nível nacional «é dos melhores».
O cuidado com os produtos usados, bem como o processo de produção, que é mais demorado por ser mais próximo do tradicional, fazem com que o preço do produto final tenha de ser mais elevado.
Ou seja, apesar do preço poder parecer alto a alguns clientes, para os proprietários acaba por ser baixo, dada a mão de obra, as horas gastas, o uso dos produtos de qualidade e de outros mais caros, como as farinhas de amêndoa e de arroz.
«Tu estás a comprar, por exemplo, um bolo sem glúten a dois euros e meio. É mais caro do que nos outros sítios. O que representa isto? Representa reforçarmos a economia local, porque estamos a comprar coisas locais. Representa reforçar a economia nacional, não só no nosso negócio, como nos outros negócios portugueses», explica Alexandra Matos.
Segundo a proprietária, as pessoas, atualmente, «preferem pagar menos no imediato, mas vão pagar mais no final da vida. Ser vegan não significa que seja mais caro, significa mais mão de obra e consciência».
Os proprietários também fazem questão de identificar todos os produtos que são do dia anterior, que são vendidos com um preço mais barato.

Apesar de este negócio ainda não ter um ano, a sua história é bem mais antiga, antes até de Alexandra e Pedro se conhecerem.
Alexandra, de Abrantes, tirou uma licenciatura em design gráfico, foi para Serpa durante seis anos e tirou um mestrado em Consumo Alimentar ao mesmo tempo que trabalhava. Antes de ir para Altura, no Algarve, devido à pandemia, esteve um ano em Mértola.
Foi já após regressar ao Algarve que conheceu Pedro e decidiu deixar o seu trabalho numa agência de comunicação, em Dezembro de 2023.
Pedro, natural de Caneças (Lisboa), trabalhou durante nove anos em gestão de stocks e logística. Foi para a escola de hotelaria, mas, “farto” de lidar com o mundo da restauração, decidiu seguir a sua paixão: a pastelaria.
O destino seguinte foi a Holanda, onde viveu durante quatro anos e chegou a trabalhar num restaurante com estrela Michelin, mas, tal como Alexandra, veio para o Algarve – onde nunca tinha estado – em 2019, devido à pandemia.
Aqui, Pedro decidiu aceitar uma proposta de trabalho, mas mantendo sempre a esperança de um dia montar o seu próprio negócio, que idealizou quando estava na Holanda.
A diferença é que antes tinha pensado em ter uma foodtruck, agora seria uma loja.
Foi nessa altura que conheceu Alexandra, a atual companheira e sócia de negócios.
Em três meses, construíram o negócio dos seus sonhos: pediram crédito ao banco e aguardaram dois meses para terem resposta.
Entretanto, houve a oportunidade de apoio do IEFP, através do projeto “Empreende XXI”, ao qual se candidataram. Mal receberam a resposta do banco, tiveram três meses para montar tudo.
Com a chave do espaço nas mãos, viveram o último mês de forma intensa, pois era a fase de organizar tudo, remodelarem a loja, sendo eles próprios os canalizadores e pintores.
Nesta fase inicial, houve «um conjunto de pessoas que ajudaram e que apoiaram», principalmente a superar as questões mais burocráticas.
«É muito importante ouvirmos a experiência das outras pessoas, aquilo por que elas passaram. Se calhar, houve muitos processos pelos quais nós não tivemos que passar, porque ouvimos os conselhos dessas pessoas», explicou Alexandra.

A adaptação a Tavira foi boa e, com o tempo, a padaria tornou-se num ponto de encontro para os vizinhos.
«Posso dizer, garantidamente, que 80% dos clientes são portugueses e locais. Isso é uma chapada de luva branca maravilhosa, ficamos mesmo muito contentes, uma vez que isto torna o negócio mais sustentável», afirma Alexandra.
A história que mais marcou os responsáveis foi a de uma menina que não podia comer nem ovos, nem produtos com lactose. Apareceu com a mãe na padaria, que lhe disse que podia escolher o que quisesse. A menina adorou poder comer um croissant, o bolo que lhe chamou logo a atenção.
«São estas pequenas coisas que fazem sentido para nós», refere Alexandra.
No futuro, os proprietários querem estar presentes em feiras e mercados. Até já receberam convites, mas recusaram-nos por não terem forma de transportar os produtos, um problema que pretendem ultrapassar.
Além disso, desejam arranjar mais uma pessoa que possa ajudar na parte da pastelaria, para haver uma produção maior.
Com a promessa de continuarem a “adocicar” o bairro, o primeiro aniversário será celebrado no próximo dia 25 de Junho, com a oferta de um bolinho a quem visitar o espaço.
Fotos: Cátia Rodrigues | Sul Informação
Fotos e texto de: Cátia Rodrigues, que é finalista do Mestrado em Comunicação e Media Digitais da Universidade do Algarve e está a fazer o seu estágio curricular no Sul Informação.