Professor universitário diz que mensagem do PCP já não atrai eleitores do Alentejo

O PCP ficou sem deputados eleitos pelo Alentejo, o que acontece pela primeira vez desde o 25 de Abril de 1974

Um professor da Universidade de Évora considerou hoje que a mensagem do PCP «deixou de corresponder às expectativas» dos eleitores no Alentejo, que, mesmo optando pelo voto de protesto contra o abandono da região, escolhem o Chega.

O PCP tem «uma mensagem do ponto de vista ideológico tão firme, assertiva e rígida que, com o tempo, deixou de corresponder àquilo que são as expectativas imaginárias» dos eleitores, «mesmo que sejam completamente distorcidas da realidade», afirmou à agência Lusa Silvério Rocha e Cunha, docente da Universidade de Évora (UÉ).

Nas eleições legislativas de domingo, a CDU perdeu o seu deputado por Beja na Assembleia da República (AR), João Dias, que estava no hemiciclo desde 2018 e não conseguiu agora ser reeleito, ficando os mandatos naquele círculo eleitoral distribuídos pelo PS, Chega e Alternativa Democrática (AD), um para cada.

Com este resultado em Beja, o PCP ficou sem deputados eleitos pelo Alentejo, o que acontece pela primeira vez desde o 25 de Abril de 1974, mais precisamente desde as primeira eleições livres em Portugal, realizadas em 1975, para a assembleia constituinte.

Pelo círculo de Évora, os comunistas deixaram de ter deputado nas eleições legislativas de 2022 e, no de Portalegre, ficaram sem deputado nas de 1991.

Aludindo ao período do pós-25 de Abril de 1974, o também coordenador do Centro de Investigação em Ciência Política da UÉ lembrou que o PCP «era uma força sociologicamente muito forte numa região rural depauperada» como o Alentejo, mas a situação mudou com o passar do tempo.

«Primeiro, o tecido social do Alentejo foi mudando, com as alterações sociais, com a integração europeia, havendo mais dinheiro e maior diferenciação do ponto de vista social e do trabalho», referiu.

E, continuou, o PCP, tal como outros partidos comunistas, foi depois afetado «à medida que o Bloco Soviético foi perdendo alguma legitimidade» enquanto polo ideológico do comunismo tradicional.

«Houve uns que deram até uma reviravolta, mas o nosso Partido Comunista, pelo contrário, manteve uma linha muito rígida e firme sob a liderança de Álvaro Cunhal», argumentou.

Segundo o especialista, «isso acabou por não se coadunar com uma sociedade de comunicação, de crescente consumo e onde um conjunto de pessoas passou a ter outro tipo de hábitos sociais, socioculturais e económicos».

A mudança da sociedade é, assim, um dos motivos que apontou para que a mensagem do PCP já não responda à insatisfação dos eleitores.

«Antes, o eleitor do PCP era muito mais comunitário, mas hoje estamos dispersos pelas novas tecnologias de informação» e as pessoas «têm hábitos de consumo que também as individualizam muito e as atomizam muito», explicou.

Considerando existir «uma certa simplificação também do descontentamento», o investigador assinalou que, perante isso, o partido Chega apresenta «um discurso muito eficaz», ou seja, evita abordar assuntos estruturais e opta por questões concretas.

«Um discurso que dá explicações simples e muito objetivas, mesmo que sejam imaginárias, é bom para ser captado por aquele leitor que está insatisfeito», acrescentou.

Nas eleições legislativas deste domingo, o PS foi o partido mais votado nos três círculos eleitorais do Alentejo, enquanto o Chega foi a segunda força política nos círculos de Beja e Portalegre e a terceira no de Évora (aqui foi ultrapassado pela AD).

O Alentejo elegeu oito deputados: três para o PS e o mesmo número para o Chega, ‘estreante’ em mandatos na região (um por cada círculo), e os restantes dois para a AD, que junta PSD, CDS-PP e PPM (um por Beja e o outro por Évora).

 



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