Uma vergonha ambiental no meio do Alentejo

Não me posso calar perante este gritante desleixo

Na A2, autoestrada que liga o Algarve a Lisboa, no centro do Alentejo, na localidade de Fortes (Ferreira do Alentejo), mesmo na berma da via, assiste-se há muitos anos a algo escandaloso e impróprio de um Estado com legislação ambiental razoável.

A fábrica de extração de óleos de bagaço de azeitona, da empresa MIGASA, provoca, 24 horas por dia, nuvens de fumo poluente com terríveis maus cheiros para a circulação da autoestrada e para as povoações vizinhas. Conforme o vento, as nuvens de poluição espraiam-se por largos quilómetros, afetando a saúde e a qualidade de vida de milhares de pessoas.

Tudo isto é do conhecimento das entidades responsáveis pelo licenciamento e fiscalização.

O caso tem merecido sucessivas diligências políticas, tal a justa revolta da população. Mas nada resultou em qualquer melhoria e respeito pelas normas de emissão, até hoje.

As empresas localizadas no Parque Industrial do Penique, em Odivelas, no mesmo concelho, têm uma atitude completamente diferente e responsável.

Nas Fortes, a situação perdura por manifesta irresponsabilidade da MIGASA, que nada quer fazer, mesmo quando contactada por especialistas na resolução do problema. Basicamente, não quer fazer qualquer investimento, deixando sobre a saúde das populações as externalidades da sua atividade.

A Câmara Municipal local e a Direção Regional do Ambiente do Alentejo assobiam para o lado, como se nada se passasse. São contemporizadores com a bandalheira existente, não tendo, até hoje, mostrado vontade efetiva de pegar no problema.

No local, já passaram várias vezes de carro, todos os ministros e secretários de Estado deste e dos anteriores Governos. Nada fizeram e todos viram na sua frente este escândalo.

Isto faz-me lembrar o que sucedia nos anos 80 do século passado com a lei do ruído e com o funcionamento das discotecas em Portugal. Todos assobiavam para o lado. Até que alguém em carne e osso, muito jovem, decide entrar na noite de Lisboa acompanhado de agentes do Corpo Especial do PSP e dá a volta ao assunto.

Com encerramentos, com obras de acústica e outras, sem que as quais as reaberturas não se permitiam. Tive ameaças graves, mas resisti. Tinha razão.

Junto desta autoestrada, estamos perante o desprezo total da Administração Pública pelas suas funções.

Não me posso calar perante este gritante desleixo. Não foi para isto que dezenas de pessoas deram de si o melhor para que Portugal tenha globalmente um ambiente sadio e equilibrado.

A nossa voz e outras vozes não se podem calar. O que se vê, sente e cheira é demasiado grave para tanta permissividade.

Têm a palavra a Câmara de Ferreira do Alentejo e o Ministério do Ambiente. Não precisamos de silêncios cúmplices, queremos ação.

 

Autor: José Macário Correia é agricultor (e ex secretário de Estado do Ambiente, entre muitas outras coisas)

 



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