Em Odemira, a arte de construir violas campaniças não se perde

Mestre Daniel Luz tem cada vez mais alunos

Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

O aluno mais velho tem 71 anos, o mais novo 34, e, desde o começo da Oficina de Viola Campaniça Mestre Daniel Luz, em São Teotónio, Odemira, todos os anos têm nascido novos aprendizes, que pode ser que um dia se tornem mais do que isso.

Em Odemira, já lá vai o tempo em que se temia que a arte de construir violas campaniças se perdesse. Esse sempre foi o grande medo de Daniel Luz, o mestre que hoje dedica muitas horas do seu dia a ensinar quem com ele quer aprender.

Aos 20 anos, começou a construir os seus primeiros instrumentos, hoje, com 83, sente-se orgulhoso por estar a contribuir para a cultura alentejana através do seu trabalho.

«Até quando era mais novo, já eram muito poucos os que faziam isto. Agora, cabe-me a mim transmitir o que sei para que não se perca nada. E o que eu noto é que há muito interesse. Claro que, em 12 alunos, nem todos têm nota máxima, mas ficam sempre dois ou três bons», revelou ao Sul Informação no dia em que, no âmbito da FACECO, ficámos a conhecer melhor o seu trabalho.

Depois de transmitir à autarquia a sua preocupação relativamente à extinção da viola campaniça, em 2019, foi inaugurado o espaço do mestre, que resulta da adaptação do antigo mercado de São Teotónio, onde Daniel Luz passou a dar aulas de construção daqueles cordofones tradicionais do Baixo Alentejo.

 

Violas campaniças – Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

As turmas são, normalmente, compostas por 12 pessoas, de todas as idades, e os cursos não têm duração definida. «Não há um prazo certo para terminar, termina quando todos os alunos tiverem o seu instrumento construído», explica, referindo que, no seu caso, precisa de cerca de «80 horas para fazer uma viola». «Um aluno precisará de muito mais, mas todos conseguem chegar ao fim com o seu instrumento construído», diz.

Jorge Guerreiro, 71 anos, é, neste momento, o aluno mais velho. Ao Sul Informação, confessa que a parte mais complicada de construir uma viola campaniça, do início ao fim, «é tudo». «É uma arte muito minuciosa, com medidas muito específicas – e nenhuma pode falhar porque, se falhar, já fica tudo mal. Mas o meu tio está-me a ensinar tudo o que sabe», diz, referindo-se ao mestre Daniel Luz.

 

O mestre Daniel Luz com o aluno Jorge Guerreiro. Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

Passado um ano e meio de aprendizagem, Jorge Guerreiro vai agora para a sua terceira viola.

Quem também já dá uns toques nesta obra de arte é Fábio Mestrinho, de 34 anos. «Sou muito curioso pelas minhas origens e pensei que devia também continuar esta arte, para ficar a saber e, um dia, quem sabe, quando for reformado, dedicar-me a isto como eles», diz, referindo-se aos companheiros que, naquele dia, também ali se encontravam a trabalhar nas suas violas.

 

O mestre Daniel Luz com o aluno mais jovem, Fábio Mestrinho. Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

Fábio é, neste momento, o aluno mais novo, mas a turma é composta por muitos outros, com idades semelhantes, alguns que até já passam o gosto aos filhos. Alice, de 7 anos, ainda não faz violas, mas já tem a sua e canta com o grupo durante as apresentações.

Contente, conta ao Sul Informação que gosta de acompanhar o pai nesta vida de artista e que, um dia, quer também fazer as suas violas.

 

Alice também já sabe tocar viola campaniça. Foto: Mariana Carriço | Sul Informação

 

Daniel Luz revela ainda que há cada vez mais mulheres interessadas em participar nos cursos, apesar de, naquele dia, não estar lá nenhuma aluna.

«Saber mexer na madeira é um privilégio, porque a madeira é uma matéria viva. Nós, desde que nascemos, até que morremos, estamos sempre ligados à madeira, com o berço e com o caixão. E por isso é uma grande paixão trabalhar a madeira, as suas cores e a sua densidade, o aspeto com que fica, estamos sempre à espera de acabar o instrumento para ver se fica bom, porque nunca vai haver nenhum igual», explica o mestre, referindo que estes aspetos são os que fazem com que goste de continuar este trabalho.

Agora, aos 83 anos, Daniel Luz sabe que tem ao seu lado bons construtores de cordofones, que irão dar continuidade a esta arte.

 

Fotos: Mariana Carriço | Sul Informação

 



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