Festival Terras sem Sombra inaugura 18.ª temporada em Ferreira do Alentejo

A nova temporada estende-se de Abril a Outubro

“Há uma paz infinita na solidão das herdades”: Quietude, Natureza e Música (Séculos XII-XXI) é o título da 18.ª edição do Festival Terras sem Sombra, que arranca no próximo fim-desemana (2 e 3 de Abril) em Ferreira do Alentejo.

A nova temporada estende-se de Abril a Outubro, vai percorrer onze concelhos, entre os quais os estreantes Mourão e Montemor-o-Novo, e conta com vários países convidados (Áustria, Bélgica, Eslováquia, Hungria, Polónia, República Checa e Espanha).

O agrupamento de câmara Trio Klavis atua a 2 de Abril (21h30), em Figueira dos Cavaleiros (Lagar do Marmelo), no concerto inaugural do Festival Terras sem Sombra.

O arranque da temporada, no concelho de Ferreira, inclui ainda uma visita muito especial ao património cultural da aldeia de Peroguarda e uma ação de biodiversidade sobre as ervas comestíveis do receituário alentejano, sem esquecer outras plantas aromáticas e medicinais cujo uso se perde na noite dos tempos.

Num ambiente cénico único – o Lagar do Marmelo do Grupo Nutrifarms, da autoria do arquiteto Ricardo Bak Gordon –, o Trio Klavis apresenta-se para um concerto intitulado “Teatro de Sombras: Música para violino, saxofone e piano”. O programa integra peças de Mozart (Kegelstatt Trio, K. 498), Eychenne (Cantilène et danse), Shostakovich (Trio n.º 1, op. 8) e Sakamoto (Forbidden Colors).

Luminária na noite escura, a grande música eleva-se no coração do olival alentejano, num espaço onde convergem a contemporaneidade agrícola, industrial e arquitetónica.

Oriundo de Viena de Áustria, o Trio Klavis tem vindo a destacar-se, no plano internacional, pela impressionante diversidade do seu repertório sonoro. O rigor interpretativo e a qualidade tonal do ensemble vienense permitem-lhe imprimir um carácter e um timbre distintos a obras-primas que vão dos períodos clássico e romântico, à era moderna. A excelência do labor artístico e as atuações “de cor” – algo pouco comum na música de câmara clássica – levam-no a tocar com uma liberdade digna de nota.

 

Peroguarda – Foto de Luís Ferreira Alves

Património cultural e biodiversidade: a aldeia de Peroguarda e as ervas do sabor alentejano

A programação do Festival Terras sem Sombra no concelho de Ferreira do Alentejo, inicia-se na tarde de sábado (2 de Abril, 15h) com uma visita guiada à aldeia de Peroguarda.

Além dos clichés associados à localidade – como o inescapável epíteto de “aldeia mais típica do Baixo Alentejo”, que lhe vem dos tempos áureos do folclorismo do Estado Novo –, Peroguarda desperta a atenção pela genuína e profunda riqueza da sua cultura tradicional, desvendada por um notável etnógrafo local, Joaquim Roque.

A freguesia sofreu grandes transformações desde que o regadio permitiu um intenso aproveitamento agro-industrial dos seus excelentes solos, mas a paisagem retém muito da beleza original e a aldeia não perdeu o genius loci, o espírito do lugar.

O fio condutor desta ação de Património Cultural é a feição tradicional da aldeia, assim como o apego aos usos e costumes, motivo de grande orgulho local. O etnomusicólogo corso Michel Giacometti amou profundamente esta terras e as suas gentes, cujo cante divulgou, e está sepultado no pequeno cemitério da aldeia.

Também ele vai ser lembrado nesta iniciativa do Festival Terras sem Sombra, de que faz ainda parte o lançamento da obra Peroguarda 58/59, de Luís Ferreira Alves, com a presença do fotógrafo, catálogo da exposição de igual nome, patente no Museu Municipal de Ferreira do Alentejo.

Na manhã de domingo (3 de Abril, 9h30), o ponto de encontro para a acção no âmbito da Biodiversidade é no Museu Municipal de Ferreira do Alentejo. Sob o mote “Quando a Botânica é também Gastronomia: Carrasquinhas, Catacuzes, Funchos & Cia.”, o Festival propõe resgatar do esquecimento algumas ervas com largos pergaminhos na gastronomia do concelho.

Nesta ação, os participantes partem num périplo pelos velhos caminhos em torno de Ferreira do Alentejo em direção ao Cabeço da Águia, de onde se avistam largos panoramas, hoje marcados pela preponderância do olival e do amendoal, mas onde persistem oásis da vida selvagem e autênticos redutos daquelas espécies.

Sob a orientação de guias experientes, o objetivo é aprender a identificar, a preservar e a consumir aquelas ervas sem colocar em risco o seu futuro e, igualmente, ficar a saber como colhê-las e usá-las.

 

Lagar do Marmelo, projeto do arquiteto Ricardo Bak Gordon

18 anos de Festival Terras sem Sombra

Criado em 2003, o Festival Terras sem Sombra é uma iniciativa da sociedade civil que pretende dar a conhecer a um público alargado um território, o Alentejo, que sobressai pelos valores ambientais, culturais e paisagísticos e apresenta, em geral, um dos melhores índices de preservação da Europa.

A comemorar 18 anos de existência, o Festival mantém-se fiel aos valores e à missão que o guiam desde a sua génese, privilegiando o carácter itinerante, a tónica na descentralização cultural, a formação de novos públicos, a inclusão e a sustentabilidade.

Os eventos, aos fins-de-semana e de acesso gratuito, incluem concertos de música erudita, visitas ao património cultural e ações de salvaguarda da biodiversidade.

A qualidade da programação coloca o Alentejo na agenda cultural europeia e fomenta o conhecimento e a memória do território.

Nesta edição, a temporada estende-se de Abril a Outubro, percorre 11 concelhos alentejanos (Ferreira do Alentejo, Vidigueira, Castelo de Vide, Santiago do Cacém, Beja, Alter do Chão, Mértola, Mourão, Odemira, Montemor-o-Novo e Sines) e apresenta concertos com agrupamentos vindos das mais diversas geografias.

O próximo destino Terras sem Sombra é a Vidigueira (14 e 15 de Maio), onde terá lugar um concerto pelo destacado ensemble vocal português Cupertinos, uma visita ao património cultural que incidirá sobre o vinho de talha e uma ação em prol da salvaguarda da Biodiversidade na Serra do Mendro.

O Festival Terras sem Sombra é uma estrutura financiada pela Direção-Geral das Artes.

 


PATRIMÓNIO CULTURAL
Peroguarda, 2 de Abril, 15h00
Ponto de encontro: Casa do Povo
Atividade orientada por: Maria João Pina (museóloga), Virgínia Dias (escritora), José António Falcão (historiador de arte), Luís Ferreira Alves (fotógrafo) e Alexandre Alves Costa (arquiteto)
Uma Aldeia no Coração do Alentejo: Peroguarda
Segundo a tradição, esta localidade conserva o nome do seu antigo terratenente e donatário, Pêro da Guarda, que viveu nos finais da Idade Média. O povo afirma ter sido morto e devorado por um javali, debaixo de uma oliveira ou de um sobreiro.A história do território em que está implantada, porém, é muito anterior, como o atestam abundantes vestígios arqueológicos identificados em diversos pontos da freguesia, na sua maioria datados do período romano, entre eles uma escultura da deusa egípcia Ísis, enfaixada dos pés ao pescoço, à semelhança das múmias. Mais tarde pertenceu à Casa do Infantado.

Visitando a aldeia de Peroguarda em 1916, o Visconde de Vila Moura considerou-a “das mais lindas e característica da região”. Algumas décadas depois, em 1938, nos tempos áureos do folclorismo do Estado Novo, foi classificada como a “aldeia mais típica do Baixo Alentejo”.

Mas as gentes da freguesia superaram este e outros clichés, despertando a atenção, pela genuína e profunda riqueza da sua cultura tradicional, desvendada por um notável etnógrafo local, Joaquim Roque.

Em 1958-59, o fotógrafo Luís Ferreira Alves sucumbiu ao encanto da terra e da sua comunidade, retratando-as num conjunto notável de imagens que são agora objecto de uma exposição no Museu Municipal de Ferreira do Alentejo e oferecem um políptico ao mesmo tempo duro e terno da vida, na região, nesses tempos.

Pouco depois chegaria o etnomusicólogo Michel Giacometti, no encalço do Cante e de outras manifestações artísticas com grande expressão. Tão firme foi a sua paixão por Peroguarda que, embora tendo falecido em Faro, em 1990, quis ser sepultado no pequeno cemitério da aldeia.

A freguesia sofreu grandes transformações desde que o regadio permitiu um intenso aproveitamento agro-industrial dos seus excelentes solos, mas a paisagem retém muito da beleza original e a aldeia não perdeu o genius loci, o espírito do lugar. Pelo contrário, guarda bem presente a feição tradicional, assim como o apego aos usos e costumes, motivo de grande orgulho local.

BIODIVERSIDADE
Cerro da Águia (Ferreira do Alentejo), 3 de Abril, 9h30
Ponto de encontro: Museu Municipal
Atividade orientada por: José João Cavaco (funcionário público aposentado) e José Luís Margarido (engenheiro técnico agrário)

Quando a Botânica é também Gastronomia: Carrasquinhas, Catacuzes, Funchos & Cia.
A padronização dos hábitos alimentares que caracteriza a sociedade de consumo dos nossos dias, levou ao esquecimento de um vasto manancial de recursos naturais, em que se destacam as ervas aromáticas e medicinais, além de muitas outras plantas que fazem parte da gastronomia tradicional.

Graças ao esforço conjunto de investigadores, de peritos em conservação da natureza e de mestres da culinária, assiste-se hoje, em terras de Ferreira do Alentejo, a um renascer do interesse por algumas plantas que fizeram parte do cardápio regional, nomeadamente em tempos de carência, e que apresentam um significativo potencial não só nutritivo, mas também do ponto de vista do enriquecimento dos paladares.

Fazem parte do património português e merecem ser mais bem conhecidas e, até, protegidas, já que, com a expansão das modernas culturas permanentes, tendem a perder o seu habitat.

Entre as ervas com largos pergaminhos na gastronomia de Ferreira do Alentejo, cabe destacar as carrasquinhas, os catacuzes e o funcho. Se todos eles tiveram ampla utilização na alimentação das classes mais humildes, tornaram-se verdadeiros “clássicos”, perdendo essa conotação original.

Hoje, por exemplo, pouca gente sabe que o funcho era bastante apreciado e largamente consumido, devido à sua abundância e às suas propriedades terapêuticas, tanto reais como místicas, pelas comunidades ciganas.

Nesta ação vamos percorrer velhos caminhos em torno de Ferreira do Alentejo e dirigir-nos ao Cabeço da Águia, de onde se avistam largos panoramas, hoje marcados pela preponderância do olival e do amendoal, mas onde persistem oásis da vida selvagem e autênticos redutos daquelas espécies. Vamos aprender a identificá-las, a preservá-las e a consumi-las sem colocar em risco o seu futuro. Vamos aprender igualmente a colhê-las e usá-las.

MÚSICA
Figueira dos Cavaleiros (Ferreira do Alentejo), 2 de Abril, 21h30
Local: Lagar da Herdade do Marmelo

TRIO KLAVIS
Violino JENNY LIPPL
Saxofone MIHA FERK
Piano SABINA HASANOVA
Programa – “Teatro de Sombras: Música para Violino, Saxofone e Piano”
Wolfgang Amadeus Mozart [1756-1791]
Kegelstatt Trio, K. 498, para clarinete, viola de arco e piano*
I. Andante
II. Menuetto
III. Rondo. Allegretto
Marc Eychenne [1933-]
Cantilène et danse pour violon, saxophone et piano
Dmitri Shostakovich [1906-1975]
Trio n.º 1, op. 8, para violino, violoncelo e piano*
RYUICHI SAKAMOTO [1952-]
Forbidden Colors*

*Adaptações/arranjos de Miha Ferk

 

 

 



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