Beja recebe esplendor da música de Praga na era barroca, sobe ao castelo e visita os fornos de cal

Música, património e defesa da biodiversidade voltam a unir-se em dois dias intensos

O Festival Terras sem Sombra apresenta em Beja, no Teatro Pax Julia (7 de Agosto, 20h00, entrada livre mediante reserva), um concerto único em Portugal da orquestra de câmara Musica Florea, que interpreta um programa notável de música barroca checa.

As propostas do festival para um fim-de-semana em cheio na capital do Baixo Alentejo incluem ainda uma panorâmica da história da cidade a partir do castelo, o mais destacado monumento da cidade (7 de Agosto, 15h00), cujo perfil marca a silhueta urbana, e uma ação de sensibilização para a salvaguarda da produção artesanal da cal, na freguesia de Trigaches (8 de Agosto, 9h30).

No sábado à noite, a orquestra de câmara checa Musica Florea e a soprano Anna Hlavenková, sob a direção musical de Marek Štrynclum, apresentam “Deus, Pátria, Rei: A Música da Era Barroca em Praga”, um programa que promete o esplendor e a exuberância, vocal e instrumental, da música checa daquele período histórico.

 

Foto: Flávio Costa | Sul Informação

Referindo-se ao concerto do ensemble em Beja, Juan Ángel Vela del Campo – diretor artístico do Festival Terras sem Sombra – destaca a excecionalidade da música checa e de uma iniciativa que apresenta “autores tão carismáticos como Jan Josef Ignác Brentner, Antonín Reichenauer ou o grande Jan Dimas Zelenka, sem esquecer o anónimo autor da Cantata per ogni tempo, exumada do arquivo da catedral praguense, ou o cúmplice piscar de olhos, ainda que não houvesse nascido na Chéquia, ao mesmíssimo Georg Friedrich Händel, pela influência exercida aí onde se executassem as suas magnas obras em solo checo”.

O agrupamento Musica Florea é um dos mais reputados ensembles europeus no campo da interpretação estilisticamente informada. Fundado pelo violoncelista e diretor musical Marek Štryncl, em 1992, tem mantido, desde então, intensa atividade.

Toca instrumentos originais ou cópias precisas dos mesmos e, na atividade artística que desenvolve, dá grande importância ao estudo das fontes e da estética dos períodos contemplados, valorizando a investigação histórica e a recriação criativa de estilos e práticas esquecidos. O seu repertório abarca a música de câmara, as peças sacras e seculares de carácter instrumental e vocal, os concertos orquestrais e as obras monumentais de género sinfónico, operático e oratório, dos primórdios do Barroco ao século XX.

Anna Hlavenková é uma solista muito requisitada para trabalhar com ensembles especializados na interpretação historicamente fundamentada. A sua trajetória profissional, rica e diversificada, torna-a uma das mais versáteis sopranos da atualidade, com uma carreira internacional espalhada por cinco continentes. Domina um vasto repertório que se estende dos cancioneiros renascentistas às épocas barroca e clássica, sem esquecer a criação contemporânea, tendo apresentado diversas peças escritas propositadamente para si pelos principais autores checos. Uma verdadeira diva do novo milénio.

 

Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Património e salvaguarda da biodiversidade

A anteceder a música barroca do Musica Florea, às 15h00 de sábado, dia 7, o Festival Terras sem Sombra sugere um olhar atento ao castelo de Beja, sob a orientação de José António Falcão, historiador de arte que investiga, há longos anos, o património artístico da cidade.

Trata-se de uma fortaleza gótica, cuja construção teve início no século XIII, após a conquista cristã, prolongando-se pelos séculos XIV e, possivelmente, XV. A imponente torre de menagem, com quase 40 metros de altura, é considerada como uma obra-prima da arquitetura militar gótica europeia e é, talvez, o mais emblemático monumento pacense.

José António Falcão sublinha, a este respeito, a forma como a história de Beja e o desenvolvimento do seu conjunto fortificado se entretecem, “estabelecendo entre si interrelações muito profundas desde a época de D. Dinis”. E acrescenta: “não se pode compreender a evolução do burgo pacense sem considerar o papel reitor das suas fortificações medievais, com realce para o castelejo e a torre de menagem”.

 

No domingo de manhã (9h30), o Festival prossegue na freguesia de Trigaches, onde está ainda viva uma velha tradição de fabrico da cal em fornos, aproveitando os resíduos do mármore do mesmo nome, material que abunda na zona e tem alimentado a construção da cidade e da região de Beja ao longo dos tempos.

O objetivo é dar a conhecer uma prática ancestral e sensibilizar para a salvaguarda de um produto alentejano de excelência. Guia esta visita uma notável conhecedora da matéria, a técnica municipal e investigadora Maria Goreti Margalha, doutorada em Engenharia Civil e docente no Instituto Superior Técnico.

O Festival Terras sem Sombra é uma temporada cultural que, em itinerância por diversos concelhos do Alentejo, propõe um programa que abarca a música erudita, o património e a salvaguarda da biodiversidade. As atividades acontecem aos fins-de-semana e são de entrada livre, sujeitas às regras sanitárias em vigor decorrentes da atual situação pandémica.

O próximo destino Terras sem Sombra é Sines (21 e 22 de Agosto), onde terá lugar o muito aguardado concerto dos checos do Clarinet Factory, um quarteto de clarinetistas que se move nas fronteiras entre a música clássica e a contemporânea, o jazz, a world music, a música eletrónica e os projetos interdisciplinares de marcado carácter inovador.

A 17.ª temporada do Festival prossegue em Ferreira do Alentejo (4 e 5 de Setembro), Viana do Alentejo (11 e 12 de Setembro) e Odemira (18 e 19 de Setembro).

O Festival Terras sem Sombra é uma estrutura financiada pela Direção-Geral das Artes.

 

Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

PATRIMÓNIO
Beja, 7 de Agosto, 15h00
Ponto de encontro: Castelo
Atividade orientada por: José António Falcão (historiador de arte)

Inveja das Águias Reais: O Castelo de Beja
A longa história de Beja girou, em larga medida, em torno do castelo.
O atual conjunto fortificado começou a ser construído por ordem de D. Afonso III e beneficiou grandemente do impulso de D. Dinis.
De planta pentagonal, compunha-se de duas portas fundamentais, abertas a nascente e a poente da alcáçova, e seis torres defensivas.
Bastante mais complexa era a cintura de muralhas que delimitava o núcleo urbano, uma cerca que integrava mais de quarenta torres e quatro portas principais (de Évora, de Mértola, de Avis e de Aljustrel), a que se acrescentaram, com o correr dos tempos, mais três (de Moura, de São Sisenando e da Corredoura).
A imponente torre de menagem, dos finais do reinado de D. Dinis, constitui um símbolo da cidade, tendo sido imortalizada por um poema de Mário Beirão.
Com algumas obras nos séculos XIV e XV, esta robusta estrutura quadrangular apresenta três registos, sendo o último rodeado por ampla varanda assente em mata-cães, solução que encontramos, poucos anos antes, na torre homóloga do castelo de Estremoz.

 

SALVAGUARDA DA BIODIVERSIDADE
Beja, 8 de Agosto, 9h30
Ponto de encontro: Junta de Freguesia de Trigaches
Atividade orientada por: Maria Goreti Margalha (engenheira civil)

De Noite e de Dia: A Produção Artesanal da Cal
A cal é um aglomerante aéreo mineral, produzido a partir de rochas calcárias, que reage em contacto com o ar.
Pode ser considerada o mais antigo produto manufaturado da Humanidade.
Em Trigaches, existe uma velha tradição de fabrico de cal em fornos, aproveitando os resíduos do mármore do mesmo nome, material que abunda na zona e tem alimentado a construção da cidade e da região de Beja ao longo dos tempos.
Após um processo químico obtido através da sua cozedura, aproximadamente a 900 ºC, obtém-se cal viva. Este processo depende das dimensões do forno, do tipo de pedra utilizada, da qualidade do combustível e, até, das condições meteorológicas.
Nos fornos de Trigaches, interessantes exemplares de arquitetura vernacular, a tarefa demorava cerca de 8 a 9 dias, envolvendo o trabalho de pelo menos três homens, dia e noite, para que a combustão ocorresse de forma contínua.
Indústria artesanal de carácter eminentemente familiar, encontra-se hoje bastante reduzida, mas a cal saída dos fornos de Trigaches constitui um produto de excelência.

 

 
 

 
 



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