Jogadores estrangeiros trocam campos de futebol pelos agrícolas no Alentejo

Babacar, Thiago e Benny ajudam na apanha e preparação dos animais

Os campos agrícolas são agora o terreno de jogo de futebolistas estrangeiros do Sporting de Viana do Alentejo, depois do fim precoce do campeonato distrital de Évora, devido à pandemia da Covid-19.

Sem as camisolas listadas do clube, três jogadores trocaram a relva sintética por um casão, num monte perto de Évora, onde são mão de obra para a tosquia de cerca de duas mil ovelhas.

Babacar, Thiago e Benny ajudam na apanha e preparação dos animais, enquanto permanece a interrupção do sonho de se tornarem jogadores profissionais de futebol.

«Não dá para jogar à bola e não temos nada para fazer. Parou todo o mundo, então, arranjámos isto para vir ganhar alguma coisa para sobreviver e ajudar a família», diz à agência Lusa o senegalês Babacar Fall, de 23 anos.

Em Portugal há quase três anos, o médio africano, que tem quase toda a família no seu país e um irmão em França, conta que pretendia visitar este ano os familiares no Senegal e que acabou por mudar de ideias devido à pandemia.

«Com a Covid-19 não dá e está tudo fechado” e, entretanto, «apareceu isto, é para aproveitar», reconhece, assegurando que não se importa deste trabalho: «não estou a roubar, é uma coisa normal, é melhor do que ficar deitado um ou dois meses».

Babacar, que tem o sonho de «subir o mais possível» no futebol, revela que está a ganhar «50 euros por dia», advertindo que o «trabalho é duro» e, em tom de brincadeira, admite que «jogar futebol é 10 vezes mais fácil».

Também pouco incomodado com as novas tarefas está o cabo-verdiano Bernardino Fortes, de 20 anos, conhecido por Benny, que está há cerca de dois meses a «apanhar ovelhas» para a tosquia e até já experimentou cortar a lã dos animais.

Benny veio sozinho para Portugal, há quase três anos, atrás do sonho de ser futebolista, mas a pandemia exigiu que começasse a «aprender coisas novas» para atenuar a dificuldade de deixar de jogar.

«Agora estou a trabalhar nas ovelhas, estou a trabalhar para ganhar dinheiro e para ajudar a minha família que está em Cabo Verde», relata, contando vir ainda a trabalhar neste verão na cortiça e nas vindimas.

Para o brasileiro Thiago Wertonge, de 22 anos, que cumpre o primeiro dia na tosquia de ovelhas, o trabalho «é um pouco duro», em que é necessário ter «técnica e força», como no futebol, mas «vai-se acostumando».

Sublinhando que «foi difícil parar a meio da época, com os objetivos para tentar conquistar», o brasileiro considera que «até foi bom», por ter arranjado «uma outra forma de ganhar um dinheiro».

Thiago ambiciona chegar ao topo do futebol português e, face à pandemia, ainda ponderou regressar ao seu país, mas decidiu ficar por receio de «não conseguir voltar» a Portugal.

Armando Branco é um dos seis tosquiadores de serviço e é também adepto do Sporting de Viana do Alentejo, pelo que não tem dúvidas em afirmar que os três têm qualidades e são tão competentes «a apanhar ovelhas como a jogar à bola».

As instalações do Sporting de Viana do Alentejo são um «abrigo» para sete jogadores estrangeiros, que alternam os dias de trabalho no campo, segundo o presidente do clube, Rogério Lagarto.

Estes atletas têm «um teto, alimentação e água quente, o básico e essencial para poderem aguardar o regresso do futebol», frisa Rogério Lagarto, acrescentando que o clube procurou «encontrar soluções» para eles, uma vez que, com o fim das competições, deixaram de receber o subsídio.

«Faz-lhes bem também começarem a entrar no caminho do trabalho, porque o futebol pode dar ou pode não dar e estão a aprender trabalhos agrícolas, que lhes podem ser muito úteis no futuro. Um dia que deixem de jogar futebol, vai ajudá-los, de certeza, a terem uma vida séria e com alguma tranquilidade», acrescenta.

O dirigente desportivo recorda que já em anos anteriores alguns jogadores aproveitavam as férias futebolísticas para trabalharem no campo e fazerem um «pé-de-meia», a fim de poderem viajar para os seus países e visitarem as famílias.

O Sporting de Viana do Alentejo ocupava o quarto lugar do principal escalão distrital de Évora, quando os campeonatos foram suspensos, em Março, devido à pandemia da Covid-19.

 



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