Terras sem Sombra levou o seu público à descoberta do Rio Ardila e do Castelo de Noudar

Enquanto se aproxima mais um fim de semana do Festival Terras sem Sombra, ecos do último, em Barrancos

“Quando a Fronteira Une: O Rio Ardila” foi o mote para a atividade ligada à biodiversidade que decorreu no domingo, dia 2 de Fevereiro, a fechar mais um fim de semana do Festival Terras sem Sombra.

O Parque de Natureza de Noudar, criado nos 1000 hectares da Herdade da Coitadinha, onde se situa o castelo que defendeu, durante séculos, uma das mais isoladas fronteiras de Portugal, foi o palco desta atividade, que juntou perto de sete dezenas de participantes, entre os quais diversas crianças…e ainda o jovem músico espanhol Pedro Bonet, que na noite anterior tinha deslumbrado o público com o seu violoncelo, no concerto em Barrancos.

As boas vindas foram dadas no monte da Coitadinha, hoje transformado em pequeno e acolhedor hotel, e que, tal como todo o Parque de Natureza, é propriedade da EDIA, a Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva.

Aliás, como explicou José Pedro Salema, presidente da EDIA, a compra e manutenção da Herdade da Coitadinha, para aí promover um projeto de desenvolvimento integrado daquele território, foi uma das medidas de compensação pela perda de habitats de ecossistemas de montado, galerias ripícolas e matagais mediterrânicos induzida pela construção da barragem de Alqueva.

E ali, em Barrancos, um concelho que nem sequer beneficia de água da albufeira, mas faz parte da Zona Proteção Especial Moura-Mourão-Barrancos da Rede Natura 2000, foi possível investir no património natural e construído.

O Parque de Natureza é um dos participantes no projeto LIFE Montado, assim como o tinha sido do LIFE Iberlince. A herdade trata do seu montado, nomeadamente de azinho, recria a atividade agrícola na Herdade, respeitando as práticas e as tradições da região, assim como cria vacas mertolengas e garvonesas, duas raças autóctones do Alentejo, bem como porco alentejano e ovelhas. Tudo com grande respeito pelo ambiente, já que, como salientou José Pedro Salema, «o uso promove a conservação do território».

 

Monte da Coitadinha – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

O complexo também aposta no ecoturismo. O pequeno hotel rural resulta da adaptação da arquitetura origina, tem condições de cinco estrelas e um restaurante, que se chama Pançona, onde se come boa gastronomia alentejana (por encomenda). Só tem um senão: para lá chegar há que percorrer sete quilómetros de estrada de terra, que, apesar de estar em condições razoáveis, não agrada a todos os possíveis hóspedes.

Além disso, a mesma estrada de terra é o único acesso ao Castelo de Noudar, um monumento com uma localização extraordinária, junto a uma curva do Rio Ardila, de onde se avista um belo panorama. Talvez por ser difícil lá chegar, o castelo recebe apenas cerca de três mil visitantes por ano.

João Serranito Nunes, presidente da Câmara de Barrancos, explicou ao Sul Informação que a autarquia, em conjunto com a EDIA, até quer melhorar a estrada, mas, porque a zona se situa em plena Rede Natura 2000, o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) tem levantado obstáculos. «Há que ter bom senso nestas questões. Não queremos fazer aqui uma autoestrada, apenas dar mais condições à via existente», acrescentou o edil, que até sabe bem como o ICNF funciona, uma vez que já foi, durante anos, diretor de um Parque Natural.

Para complementar a sua atuação no território, recentemente o Parque de Noudar adotou um troço de 500 metros do Rio Ardila, um afluente do Guadiana que, ali em Barrancos, divide Portugal de Espanha. Tudo isso, no âmbito do Projeto RIOS, uma iniciativa ibérica que começou na Catalunha e que, no nosso país, foi abraçado pela Associação Portuguesa de Educação Ambiental, a ASPEA.

Acompanhados por Diogo Nascimento (engenheiro florestal), Manuela Ruivo (ambiente), Helena Barbosa (recuperação de linhas de água) e ainda de Débora Moraes e José Perdigão (especialistas em património), o grupo desceu desde a Herdade da Coitadinha até ao Rio Ardila, que passa aos pés do Castelo de Noudar.

 

A caminho do Rio Ardila – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

A curta viagem foi feita de trator ou de carrinha de caixa aberta, primeiro, e depois a pé, seguindo por um dos muitos percursos pedestres marcados no Parque de Natureza. À beira da água que corria depois de uns dias – poucos – de chuva mais intensa, os participantes foram divididos em dois grupos, para se dedicarem à tarefa de caracterizar o rio, ao nível da fauna, da flora e da qualidade da água.

«Esta é a primeira iniciativa que fazemos aqui, no Ardila, no âmbito deste projeto RIOS. Depois haverá outras saídas mais pormenorizadas, bem como uma ação de beneficiação, com limpeza das margens, e de plantação de árvores próprias das galerias ripícolas», explicou uma das técnicas que guiaram os grupos.

Os participantes mais entusiastas foram as crianças. O jovem Gabriel, filho do presidente da EDIA, não se importou de se descalçar e meter-se dentro da água fria do Ardila, para o atravessar a vau até à margem espanhola e assim ajudar a medir a largura do rio. Depressa foi seguido pela cadela Fiúza e pelo pequeno Fernão que, mesmo reclamando da temperatura fria, se molhou todo nas águas.

Depois, foi o regresso ao Monte da Coitadinha, para um almoço substancial e saboroso, feito por Nuno Santos que, além de engenheiro florestal, é o chef de serviço.

 

A medir a largura do Rio Ardila – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Rio internacional, o Ardila nasce em Espanha, na serra de Tentúdia, a 1100 metros de altitude, cruza transversalmente a província de Badajoz e desagua na margem esquerda do Guadiana, perto de Moura, a uma cota de 95 metros.

Na sua bacia, com uma área de 1043 quilómetros quadrados, destacam-se dois afluentes, o arroio de Benferre, em solo espanhol, e a ribeira de Murtega, já em Portugal. Ao passar junto a Noudar, em Barrancos, faz vários meandros, um dos quais designado Volta do Mango.

Sendo fronteira com Espanha, esta área foi cenário de muitas histórias, nomeadamente as relacionadas com o contrabando. As margens guardam uma flora abundante, incluindo espécies únicas para Portugal, como o Geranium malviflorum, cuja presença em Noudar é surpreendente, devido ao afastamento geográfico entre a pequena colónia aqui existente e as populações mais próximas em Espanha, a cerca de 160 quilómetros. Não se revela menos rica a avifauna, com destaque para o guarda-rios, a garça-cinzenta, a cegonha-preta, a águia-imperial e o grifo.

E o que tem tudo isto a ver com o Terras sem Sombra, que, afinal, é um festival de música? Como explicou José António Falcão, diretor artístico do certame, a salvaguarda da biodiversidade tem sido, desde há anos, uma das marcas deste festival diferente. Afinal, o objetivo é mesmo promover o património do Alentejo. E o património natural é uma peça fundamental dessa essência alentejana.

 

Fotos: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

E agora…rumo a Mértola

Mértola, no fim de semana de 15 e 16 de Fevereiro, é o próximo destino Terras sem Sombra, numa viagem que promete ser inesquecível.
O Festival revisita o legado islâmico, no sábado às 15h00, acompanhado pelos arqueólogos Susana Gómez e Cláudio Torres.
Para a noite, o encontro é às 21h30, na Igreja Matriz de Nossas Senhora de Entre-as-Vinhas, para ouvir José Hernández Pastor, contratenor solo a cappella, num programa musical repleto de espiritualidade.
No domingo de manhã, às 9h30,os participantes reúnem-se na Horta da Malhadinha para perceber como funciona a agricultura sustentável.
Todas as atividades são gratuitas e não precisam de inscrição prévia.

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