É preciso «políticas públicas para atrair gente e investimento a Barrancos»

O concelho raiano do Baixo Alentejo precisa de medidas concretas para criar emprego e atrair gente

O presidente da Câmara João Nunes, com a vice-presidente Manuela Lopes e a ovelha mascote do Terras sem Sombra Kids – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

«O isolamento, que resulta em falta de empregos que mantenham aqui os nossos jovens ou atraiam mais gente e mais investimento, é o nosso grande problema». As palavras são de João Serranito Nunes, presidente da Câmara Municipal de Barrancos, concelho do Baixo Alentejo, situado na margem esquerda do Guadiana, paredes meias com Espanha.

«É um concelho isolado, está distante de todas as infraestruturas que são necessárias para haver o desenvolvimento que se pretende, mas isso só se resolverá se as políticas de coesão forem, efetivamente, concretizadas. Não vale a pena falar de coesão, se não forem aplicadas medidas concretas e diferenciadas a estes territórios», acrescentou o autarca socialista, em entrevista ao Sul Informação.

Os dados divulgados pela Pordata no seu site são claros: Barrancos tem 1657 habitantes, 164 idosos por cada jovem e uma densidade populacional de apenas 9,8 pessoas por quilómetro quadrado. O concelho de Lisboa, por exemplo, tem uma densidade populacional, de mais de 5000 pessoas, o de Beja de quase 30 pessoas. Com poucos jovens e muitos idosos, também há poucos nascimentos: em 2018, nasceram apenas 15 bebés neste concelho.

Para chegar a Barrancos, a estrada nacional é estreita e sinuosa. O Centro de Saúde local tem médico das 9h00 às 17h00 e, se houver uma urgência durante o resto do dia e da noite, há que ir para Beja ou Évora, cada uma delas distantes 100 quilómetros da vila alentejana. Ir e voltar são 200 quilómetros. Escola só há até ao 9º ano. Os jovens que quiserem continuar os estudos têm de sair do concelho.

A Câmara Municipal, como acontece na maioria dos concelhos raianos e interiores, é o grande empregador do concelho. Mas também é esta autarquia que garante o grosso do apoio aos bombeiros, ao lar de idosos ou mesmo à escola. Tudo isto, com um curto orçamento que, para o corrente ano de 2020, se ficou por 4,6 milhões de euros.

 

Praça da Liberdade, em Barrancos, o “Antigu Largu da Praça” (em barranquenho) – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Em entrevista ao Sul Informação, feita no domingo, em Barrancos, quando ainda não se sabia das medidas para o interior que o Governo anunciou ontem, o autarca João Nunes manifestou alguma esperança de que, «havendo agora um Ministério da Coesão», comecem a mudar as políticas.

E que medidas seriam essas? «Variadíssimas medidas, poderia encontrar três, quatro, cinco medidas que resolveriam o problema. Em primeiro lugar, tem que haver políticas públicas! Ninguém pense que um privado vem para aqui, a 100, 150 quilómetros de um centro qualquer, com más acessibilidades. Ninguém se fixa em territórios como o de Barrancos sem ter um incentivo grande à sua instalação, à laboração, ao pagamento dos seus trabalhadores. Há que ter isenções fiscais, mas concretas e objetivas», defendeu o autarca barranquenho.

«E que sentido faz que nós tenhamos um médico em horário de função pública, das 9 às 5? Temos que ter apoios aos médicos, aos professores, para que aqui se fixem. Não faz sentido que um professor, colocado através do concurso nacional, venha de Braga, fazer oito ou dez horas de viagem. Não ganha sequer para a renda da casa. Temos de voltar aos concursos regionais para a colocação de professores, porque ao menos as pessoas estarão mais próximas».

João Nunes admite que as medidas para o apoio ao interior custem dinheiro ao erário público. Mas, defende, não são um gasto, «são um investimento para que as pessoas não saiam daqui. Senão quando vierem as medidas, já não há cá pessoas», avisa.

 

Os barrancos de Barrancos – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Em anos anteriores, o município de Barrancos foi aproveitando os apoios da União Europeia para melhorar as suas infraestruturas, que hoje são de qualidade. «Temos um bom cineteatro, umas boas piscinas, áreas desportivas, uma escola que também é boa», salienta o presidente da Câmara.

«Mas, qualquer dia, não temos pessoas para usufruírem de tudo isso. Isso é que é dramático! Não é só pelas infraestruturas que o município tem feito que se consegue segurar as pessoas. As pessoas precisam de oportunidades de trabalho, mas as empresas precisam de ter apoios concretos e de condições para aqui se fixarem e criarem o emprego que tanta falta nos faz», advertiu João Nunes.

A Câmara, com o seu curto orçamento municipal, tenta fazer o que pode. Por exemplo, passou, desde há três anos, a fazer parte da rede de concelhos alentejanos que recebem os fins de semana do Festival Terras sem Sombra, como aconteceu agora, a 1 e 2 de Fevereiro. Nesses dois dias, a população local aumentou em pelo menos uma centena de pessoas, que ocuparam as unidades hoteleiras – a Herdade da Coutadinha, no Parque de Natureza de Noudar, o hotel Agarrocha, na sede de concelho -, foram aos restaurantes, fizeram compras no comércio. E levaram dali uma boa imagem, que partilharam desde logo nas redes sociais.

Mas é preciso fazer muito mais para quebrar o isolamento do concelho. Será que o autarca de Barrancos já fez chegar estas preocupações ao Primeiro Ministro? «Sim, já as fiz chegar por escrito e diretamente, em conversas várias. Fiquei com alguma expectativa. Estou agora a aguardar uma reunião com a ministra da Coesão Territorial para, in loco, verificarmos e discutirmos exatamente quais são as medidas concretas que devemos tomar para que estes territórios não se esvaziem de gente».

«Não faz sentido que Portugal ande a duas velocidades. Barrancos, pelo facto de sermos poucos e de representarmos poucos votos, não pode ser, de maneira nenhuma, abandonado. E o que se tem verificado até agora é que as pessoas se sentem abandonadas.!», concluiu João Nunes.

 

Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

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