Não há fatos e gravatas, nem papéis para assinar ou emails oficiais para tratar. Quando passa a porta do pequeno estúdio que tem instalado no último andar de sua casa, Luís Gomes, presidente da Câmara de Vila Real de Santo António, passa a ser Luís, o artista, e a dedicar-se a um sonho: o de compor e gravar músicas.
No “santuário” do autarca, os papéis que se veem têm letras de músicas e, no ambiente de trabalho do computador, estão diversos ficheiros de áudio e vídeo, entre os quais os três telediscos que Luís gravou com o músico cubano Baby Lores, um dos grandes nomes do estilo reggaeton, o último dos quais acabadinho de chegar à Internet.
Foi neste ambiente que a equipa do Sul Informação foi recebida e falou com um descontraído Luís e com Baby Lores, artista que o desafiou a entrar nesta aventura, na passada sexta-feira. O estúdio de gravação privado do edil de VRSA serviu de enquadramento a uma história que começou como uma brincadeira de amigos, mas está a ganhar contornos cada vez mais sérios.
«Tudo começou porque ele me encontrou em Havana», atira, a rir, Baby Lores. «O Lores é muito amigo de um médico que eu conheço e trabalhava com a Câmara no âmbito dos acordos de cooperação que tínhamos na área da saúde. Um dia, combinámos uma reunião no hotel onde eu estava, para ele apresentar o seu trabalho, já que ele se mostrou interessado em vir a Portugal tocar e nós tínhamos uma série de eventos culturais programados», contou, por seu lado, Luís Gomes.
«Sempre achei que ele tinha muito talento. É um dos grandes artistas cubanos e vai afirmar-se nos próximos anos como um grande músico latino», acredita o edil de VRSA.
A partir daqui, desenvolveu-se «uma grande amizade» entre Luís e Lores, onde a música desempenhou sempre um papel importante. «Entretanto, o Baby Lores acabou por vir dar mais concertos a Portugal, contratados por outras pessoas, e, devido ao meu gosto pela música, acabámos por escrever em conjunto um tema, em jeito de brincadeira. Foi o Ando Buscando, e funcionou muito bem», contou.
Seguiram-se os convites de Lores a Luís para participar em concertos. «Uma vez, fui em trabalho a Cuba e ele convidou-me para ir cantar. E a coisa correu bem», resume o autarca vilarrealense.
«Quando o conheci, foi como alguém que tem um cargo político importante, que tinha relações oficiais com Cuba. Mas, depois, vi-o a fazer de DJ numa festa na praia, o que não é comum num político. Um dia, estava a tocar guitarra, e o Luís pôs-se a cantar. E gostei do que ouvi. Começou como um divertimento, mas percebi que havia potencial artístico importante, que podia ser desenvolvido», contou, por seu lado, Baby Lores.
Este feedback positivo levou o presidente da Câmara de VRSA a encarar a música de uma forma mais séria – «quando dedico tempo a uma coisa, é porque ela é importante para mim e empenho-me a 100 por cento» -, até porque sempre teve uma forte ligação à música, como bem ilustrou na entrevista ao Sul Informação:
Entretanto, Luís já tem seguidores em Cuba. «A minha mãe é a maior fã dele. Gosta muito da sua voz, diz que é romântica e tem muito sentimento», revelou Baby Lores.
E é de música romântica que falamos, já que os oito temas que Luís e Lores escreveram em conjunto são todos a apelar ao coração. «Somos ambos uns românticos e só dá para o amor. Já tentei escrever sobre uma bicicleta, ou assim, mas não deu», disse Luís, a rir.
Estes temas, que têm tocado em concertos ao vivo, como aquele que protagonizaram na véspera de Ano Novo em Monte Gordo, são já o embrião de um álbum que a dupla está a preparar.
Apesar de não haver «uma data exata para o concluir», Luís e Baby Lores têm vindo a trabalhar de forma consistente para gravar um trabalho em conjunto, mesmo tendo em conta que o primeiro tem de se preocupar com os destinos de uma Câmara Municipal e o segundo tem «a sua carreira musical».
«Este é um projeto paralelo. Mas queremos fechar este ciclo com um álbum, que deverá ter 12 músicas. Estamos já a negociar com algumas produtoras para o comercializar», revelou Luís Gomes.
E, apesar da distância entre Vila Real de Santo António e Cuba, não tem sido difícil trabalhar em conjunto. «Quando nos juntamos, eu invento melodias com a guitarra, que gravamos com o telefone. Quando regresso, o Luís já escreveu a letra da música. É algo fácil e rápido», diz o músico cubano.
A cumplicidade entre os dois músicos ficou bem patente no “mini show” protagonizado pela dupla, para as câmaras do Sul Informação:
Quanto ao futuro e se este passa por uma carreira no mundo da música, Luís não abre o jogo, embora não enjeite a possibilidade. «Tudo tem o seu tempo, ninguém pode dizer o que será o dia de amanhã», atirou. Mas, seja qual for a escolha do ainda edil de Vila Real de Santo António, não será manietada pelo politicamente correto.
«As pessoas em VRSA conhecem-me bem. Há poucas particularidades que as pessoas não conheçam. E isto da música tem vindo a mobilizar as pessoas do concelho, que têm reagido muito bem. O que é importante é fazer as coisas bem e com dignidade. Não temos de ser o que as pessoas querem que nós sejamos, temos de ser o que somos e honestos para nós e para com os outros», concluiu.
Vejas as fotos da entrevista e do “mini-show”:
Fotos: Nuno Costa e Hugo Rodrigues| Sul Informação