Há 125 anos, a chegada do comboio ao Algarve foi um acontecimento que gerou natural entusiasmo. E, aparentemente, o passar do tempo não esfriou os ânimos, quer dos que tiveram a oportunidade de viajar no renovado Comboio Presidencial, quer dos que, ao longo do caminho, escolheram lugares estratégicos para o fotografar.
O Museu Municipal de Faro lançou a ideia e a Fundação Museu Nacional Ferroviário juntou-se às Câmaras de Faro e Vila Real de Santo António para assinalar a data, com uma viagem entre as duas cidades. A histórica composição já havia feito viagem de Norte a Sul do País, mas só agora percorreu, pela primeira vez, a Linha do Algarve.
Entre os passageiros que saíram, à hora marcada, da estação de Vila Real de Santo António estavam alguns presidentes – como impunha o nome do comboio – e representantes de diversas entidades, jornalistas, elementos da Fundação Museu Nacional Ferroviário e da CP, mas também alguns “sortudos”, que ganharam um dos bilhetes destinados aos que não quiseram perder esta experiência. Em alguns casos, esta oportunidade serviu para realizar um sonho.
Nadine Conchinha é aluna da Universidade do Algarve, mas nasceu e cresceu no Entroncamento, onde «tudo anda à volta dos comboios». «Assim que soube que existia esta oportunidade, quis logo participar. Eu sabia que o comboio estava ser restaurado, lá em cima. Não tive a oportunidade de participar na primeira viagem, a Famalicão e, assim que houve cá, aproveitei», contou.
Não foi preciso insistir muito para esta passageira do Comboio Presidencial revelar que é uma adepta de comboios, uma verdadeira “trainspotter”, como muitos que foi possível ver ao longo da viagem, que esperavam a sua passagem.
«Alguns são vizinhos meus, lá do Entroncamento, que, tal como eu, são apaixonados por comboios. O que fazem é acompanhar a evolução dos Caminhos de Ferro de Portugal e fotografam tudo o que podem e partilham. Fotografam desde comboios internacionais que venham cá até comboios portugueses que sejam restaurados», revelou.
Tendo isto em conta, Nadine Conchinha não poderia estar mais feliz. «Está a superar em muito as minhas expetativas. É fascinante este comboio! É fascinante a qualidade com que ele ficou depois de restaurado, tudo o que nós estamos a aprender. É absolutamente extraordinário», disse, visivelmente entusiasmada, a jovem universitária.
Comboio centenário foi recuperado entre 2009 e 2013
«Este é um projeto que começou em 2009. O restauro terminou no ano passado. Fizemos a inauguração em dezembro e, depois, algumas viagens promocionais pelo país e vimos agora ao Algarve, para fazer toda a cobertura nacional», explicou a gestora do projeto Comboio Presidencial Maria José Teixeira, composição que esteve originalmente ativa entre 1910 e 1970.
«Fomos desafiados pelo Museu Municipal de Faro (MMF) a trazer cá o comboio e acolhemos imediatamente a ideia. Entretanto, também começámos a trabalhar com a Câmara de VRSA. Devo dizer que ambas as autarquias têm sido incansáveis no apoio que têm dado a esta iniciativa», acrescentou.
«Esta data tem uma importância fundamental, na nossa história. O Algarve estava, de certa forma, isolado do resto do País. As acessibilidades e mobilidade reduzia-se, quase exclusivamente, a vias marítimas, já que as terrestres eram bastantes rudimentares. Como o comboio já circulava pelo resto do país, o Algarve ficou mais próximo de outros centros urbanos importantes. Como se dizia na altura: o progresso chegou a Faro», explicou, por seu lado, o diretor do MMF Marco Lopes.
«O ponto principal do cartaz é a viagem do Comboio Presidencial, que é bom frisar que não foi o que fez a viagem inaugural há 125 anos, é posterior. De qualquer das formas, como houve um trabalho de restauro e por ser um comboio emblemático, quisemos aproveitar para o trazer para o Algarve», acrescentou.
Esta viagem foi apenas o início de um programa mais vasto, de celebração deste acontecimento. «Vamos ter a inauguração de uma exposição que o Museu já está a preparar há algum tempo e quer se vai dedicar aos 125 anos da chegada da ferrovia, as peripécias da chegada do comboio ao Algarve, o património ferroviário e os profissionais», disse
A exposição estará patente até agosto de 2016, essencialmente, para dar a oportunidade de conhecer a mostra «às escolas e outro tipo de públicos, que não poderá estar presente até final do ano».
Passeios turísticos estão na agenda do Museu Nacional Ferroviário
O Comboio Presidencial é património, mas também será um instrumento ao serviço da economia. «Portugal era um dos poucos países na Europa – e do Mundo – que não tinha um comboio patrimonial apto a circular em toda a linha férrea nacional. Com este comboio, estamos prontos a providenciar esse novo serviço turístico», revelou Maria José Teixeira.
«Estamos a trabalhar num modelo de negócios e temos em cima da mesa um conjunto dos operadores turísticos que estão interessados em explorar o comboio. Nós somos o Museu Ferroviário e não é essa a nossa área, a turística. Queremos um parceiro e equilibrar a questão patrimonial com a criação de valor económico», explicou.
Maria José Teixeira acredita que em 2015 a estrutura «estará toda montada» e que o comboio «estará apto e vai circular por todo o país». Apesar de ontem ter sido puxada por uma locomotiva moderna, a composição histórica tem uma locomotiva a vapor funcional, ainda que a sua utilização esteja sempre condicionada pela existência de pontos de água que a permitam reabastecer com regularidade.
«Estou certa que este comboio irá regressar ao Algarve. E devo dizer que os ingleses têm uma paixão enorme pela ferrovia e há muitos residentes ingleses aqui na região. Por isso, nem pensar deixar o Algarve de fora», disse, a rir, a coordenadora do projeto Comboio Presidencial.
Quem não quer perder esse comboio é a Câmara de Faro. «Estamos a trabalhar nesse sentido. Estamos a apostar muito no Turismo, em Faro, com novos eventos, novas condições. É uma atividade com que Faro nunca se preocupou muito, mas hoje temos uma nova dinâmica na cidade, com vários hostels, que abriram nos últimos dois anos e ainda vão abrir mais. Temos muito mais movimento», disse o edil farense Rogério Bacalhau. «Queremos que as pessoas venham ter connosco, que nos visitem e nos levem na memória. Isso é que é importante», concluiu.
Durante a viagem, o autarca não escondeu a surpresa com vários pormenores do Comboio Presidencial. Aliás, após ter dado uma primeira volta, de exploração, serviu de “guia” a outros passageiros, para mostrar algumas das pérolas que descobriu, como os lavatórios, a cozinha ou os adereços que tornam a experiência de fazer uma viagem nesta composição bem diferente.
As entrevistas reproduzidas nesta peça foram realizadas pelo Sul Informação em parceria com a Rádio Universitária do Algarve RUA FM.