É uma situação no mínimo insólita: os deputados do PS na Assembleia Municipal de Vila do Bispo ajudaram a chumbar o orçamento da Câmara, que é gerida pelo socialista Adelino Soares.
O orçamento, que tinha sido aprovado em reunião de Câmara no dia 6 de dezembro, com os votos do presidente, da única vereadora do PS e da vereadora do PSD (há muito aliada a Adelino Soares), mas enfrentando já a oposição do outro vereador PSD (o ex-presidente Gilberto Viegas) e do movimento MDI (o também ex-presidente José de Deus Rodrigues), totalizava 17 milhões 727 mil euros.
No entanto, numa reviravolta que deixou «boquiabertos» elementos das forças políticas da oposição, como os próprios confessaram ao Sul Informação, quando o Orçamento para 2012 e as Grandes Opções do Plano foram discutidos em Assembleia Municipal, no dia 16, acabaram por ser reprovados, não obtendo um único voto a favor, mas sim três abstenções e 17 votos contra, incluindo dos elementos do PS, a mesma cor política do presidente da Câmara. Do Partido Socialista, todos os deputados municipais votaram contra, à exceção de Rui Correia, presidente da AM, que se absteve.
Na base deste chumbo redondo e algo inesperado do orçamento, estão, segundo apurou o Sul Informação junto de diversas fontes políticas de Vila do Bispo, os factos de o orçamento, em ano de contenção financeira generalizada, ser o segundo maior de sempre nesta pequena Câmara Municipal, e de conter algumas «ilegalidades ou pelo menos irregularidades, à luz do POCAL», o Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias Locais.
Luís Costa, presidente da Junta de Freguesia de Vila do Bispo eleito pelo movimento independente MDI e membro da Assembleia Municipal, salientou que um dos problemas é que «a despesa corrente é superior em um milhão de euros à receita corrente», uma «questão estrutural» que o Orçamento previa que fosse ultrapassada recorrendo a receitas extraordinárias, nomeadamente à venda de património.
Ora, ao que disse um eleito do PSD ao Sul Informação, «esse é um expediente que se sabe que não dará os resultados necessários, até porque parte do património a vender é habitação social que já está ocupada e outra parte são terrenos e imóveis para os quais, na atual situação do mercado imobiliário e da construção, há pouca ou nenhuma apetência».
«Se este orçamento fosse aprovado, era um buraco que ali se criava, a juntar às dívidas já existentes, e um buraco com tendência para aumentar», acrescentou, por seu lado, Luís Costa.
Outra irregularidade, num documento paralelo, tinha a ver com o Mapa de Pessoal para 2012. A Câmara de Vila do Bispo, tal como todas as outras do país, vai diminuir o número de chefias e, no seu caso específico, já aprovou a passagem de sete divisões para duas. Mas o Mapa de Pessoal apresentado para aprovação era exatamente igual ao do corrente ano de 2011, com o mesmo número de divisões e chefias. Outra questão «técnica» que terá contribuído para a decisão de chumbar os documentos.
Na discussão do Orçamento na Assembleia Municipal, o próprio presidente da Câmara (com o qual o Sul Informação tem tentado falar nos últimos dias, sem sucesso) terá reconhecido que se tratava de um documento «desequilibrado».
Aliás, na sequência desta atitude e da rejeição do Orçamento também com os votos em bloco do PS, há quem pense que o chumbo foi promovido pelo próprio presidente Adelino Soares.
«Após a reunião de Câmara em que o orçamento foi aprovado, Adelino Soares terá sido alertado para as irregularidades do documento e aconselhado a retificá-lo. Não podendo já voltar atrás, a solução foi provocar o chumbo do Orçamento em sede de Assembleia Municipal, já que, assim, o documento volta para trás e é possível alterá-lo e corrigi-lo», salientou uma fonte contactada pelo Sul Informação.
Uma versão e uma explicação que não foi possível confirmar com o presidente da Câmara, uma vez que ele não tem querido falar sobre o assunto.
Entretanto, e porque agora é preciso que haja uma nova versão do Orçamento, Adelino Soares já convidou representantes de cada uma das forças políticas com assento na Assembleia Municipal para uma reunião.
Será uma negociação que se adivinha difícil, já que o autarca socialista, com as peripécias que rodearam a reprovação da versão inicial do documento, perdeu a diminuta autoridade que tinha, com uma Câmara em que só tem maioria por causa da aliança um pouco contra-natura com um dos dois vereadores do PSD e uma Assembleia Municipal em que também depende do voto de pessoas ligadas aos dois movimentos independentes para obter uma maioria.
Na sequência deste inesperado chumbo do Orçamento de Vila do Bispo, a Câmara local terá agora de começar o ano de 2012 a viver com duodécimos, uma situação indesejável que se irá manter até que o novo documento seja aprovado na Assembleia Municipal. Mas, ao que tudo indica, isso não acontecerá antes do final de janeiro, na melhor das hipóteses.
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